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Thursday, May 30, 2013

Conde, o Início da Trilha (parte 5)


Todos os anos, o ginásio em que estudava fazia um desfile muito bonito para comemorar o Dia da Primavera. Nesse ano, fui convidada pelo diretor da escola para participar do Concurso de Miss. Concorri com mais duas colegas e ganhei o concurso. Na noite da coroação, vestia um vestido longo de brocado de seda e de cor prata, usava sapatos feitos com o mesmo tecido do vestido. No dia seguinte, eu e as duas princesas saímos às ruas num carro alegórico, abrindo o desfile com os outros alunos. Eles também usavam roupas típicas do desfile representando o nosso folclore, como baianas, índios e pescadores. Eu tinha dezessete anos.

Desfile da Primavera (Na foto: Eu, Márcia Castro e Eulália)

Foi quando eu comecei a namorar um moço que era sócio de uma torrefação de café na cidade de Alagoinhas. Ele tinha casa de veraneio no Conde e era bem mais velho que eu. Pediu permissão para meus pais e foi aceito de imediato porque eles o consideravam um bom partido. Uma vez, levou-me para passar uma semana em sua casa em Alagoinhas e, lógico, mamãe foi junto. Ele morava sozinho com a empregada, que cuidava dele como se fosse seu filho. Tudo estava indo muito bem, eu estava feliz porque gostava muito dele, e ele já pensava até em me pedir em casamento. Não o via frequentemente porque ele morava e trabalhava em outra cidade. Em um dos finais de semana em que veio me visitar, eu o senti um pouco distante e perguntei-lhe o que estava acontecendo. Ele me respondeu:

– Zeza – nome carinhoso pelo qual ele me chamava –, estive pensando e cheguei à conclusão de que não temos nenhum futuro juntos porque você é muito pobre. Minha família e meus amigos acham que devo procurar uma moça que tenha uma situação financeira como a minha.

Em choque, magoada e sentindo-me humilhada, não acreditava naquilo que estava ouvindo. Disse-lhe então:

– Você tem idéia do que acaba de me dizer? Você sabe que eu te amo, e, além do mais, o que vou falar para minha família?

– Fale o que quiser, não é problema meu!

Dizendo isso, retirou-se. Demorei muito para aceitar essa separação. E o que mais me doía era a prepotência e a arrogância com que me contara a sua decisão. Meus pais o procuraram para uma explicação, porém esse indivíduo desapareceu. Hoje não sei se ainda vive. Se sim, gostaria que soubesse o grande favor que me fez ao me abandonar. Se estivesse com ele, não teria tido a oportunidade e a felicidade de ter como marido um homem maravilhoso como Jouko, o privilégio de ter a experiência de vida, a cultura e o conhecimento que tenho, falando, lendo e escrevendo em quatro idiomas. Se estivesse com ele, talvez hoje fosse pobre de verdade, vivendo na ignorância e na escuridão de não conhecer os direitos humanos e o respeito pela vida, assim como ele, seus amigos e sua família. Felizmente o tempo passou e, com ele, a decepção.


Depois disso, passados dois anos, estávamos todos sentados na sala de Joselita, que estava grávida, quando percebemos que ela estava com contrações. Algumas horas mais tarde, minha irmã deu à luz uma linda menina que recebeu o nome de Jocely Ana, nome esse escolhido por mim em homenagem a uma colega de sala da qual eu gostava muito. Hoje, essa sobrinha é uma das grandes paixões de minha vida. Cuidei dela por algum tempo. Sempre a tive como se fosse a minha própria filha.

Nessa época, meus pais decidiram que nos mudaríamos para Salvador:

– Filha, decidimos vender as duas casas e as terras que temos porque pensamos em mudar para a capital, Salvador. Como sabemos, sua mãe não anda bem de saúde e lá terá o tratamento adequado. Como você está concluindo o ginásio, será a chance de continuar os seus estudos.


Elevador Lacerda - Salvador/Bahia (Foto: Flickr by Áthila Armstrong)

Fomos para Salvador, mas, durante a mudança, a moeda brasileira foi terrivelmente desvalorizada, e quando papai recebeu o dinheiro que havia emprestado a seu primo a juros, só deu para alugar uma casa e comprar um caminhão, que foi destruído posteriormente em um acidente. Sem seguro, perdemos tudo e, para recomeçarmos, papai abriu novamente um armazém.










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