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Thursday, July 18, 2013

OUTRA TEMPORADA NO BRASIL

No avião, em uma dessas minhas idas e vindas....

Chegou o dia de meu retorno à Finlândia. Dessa vez, pedi a Jouko que me levasse de carro para Varsóvia. Não queria mais viajar em avião pequeno. Não tinha ainda esquecido o último voo que fizera. Saímos de carro, de manhã bem cedo, viajamos por mais de quatro horas e, antes de ir para o aeroporto, fizemos um passeio pela cidade, conhecendo os pontos turísticos.

Cheguei a Helsinki no dia dois de dezembro. Como sempre, nessa época do ano, o país estava coberto de neve, e a temperatura, com graus negativos. Só ficaria lá quatro dias porque, no dia seis, estaria decolando para Londres e, de lá, pegaria um voo para São Paulo seguindo para Salvador. Adriana e Jusef iriam comigo. A viagem de Londres para São Paulo foi um pouco cansativa. Como sempre, esses voos estão sempre lotados nessa época do ano. Não entendo por que as empresas aéreas reclamam tanto de prejuízos. A comida era pouca, e o espaço, também. Nenhum de nós conseguiu dormir. Desembarcamos em São Paulo às 7 horas do dia seguinte e, para minha tristeza, sentia novamente tonturas e muito cansaço. 

Estava ansiosa porque, além de não ver meu filho por onze longos meses, era dia sete de dezembro, dia de seu aniversário, e havíamos marcado de nos encontrar no desembarque. Dois dias antes de minha partida, liguei da Finlândia para ele e deixei o recado na secretária eletrônica dizendo o dia e o horário de nosso desembarque no Aeroporto de Cumbica em São Paulo. Ele estava em outra cidade fazendo um curso, por isso chegou tarde a sua casa e não teve tempo de checar seus recados na secretária eletrônica, não sabendo de minha chegada. No aeroporto, procurava meu filho por todos os lados. Tinha, nas mãos, uma sacola com seu presente e, no coração, a vontade de abraçá-lo. Fomos para o andar de cima a fim de fazer o check in para Salvador. Ainda tinha esperança de encontrar Ricardo e pensava que talvez estivesse atrasado. Liguei para sua casa e a mesma secretária eletrônica respondeu à chamada. Adriana estava muito estressada porque não havia encontrado em nossa bagagem o carrinho de bebê de seu filho que, por irresponsabilidade da empresa, ficara em Londres. Fizemos finalmente nosso check in para Salvador. A tontura incomodava-me muito, e eu não tinha tempo de ficar frustrada e nem de pensar que, depois de tantos tratamentos que havia feito, depois de tantos gastos, aquilo estaria acontecendo, pois a felicidade de rever minha família e, principalmente, minha irmã gêmea era mais forte.

Nosso vôo para Salvador foi ótimo e, na descida, o sol brilhava intensamente. Era como se eu estivesse recebendo as boas-vindas. Isso fez com que me lembrasse de que havia pagado uma fortuna, na Polônia, para receber artificialmente alguns raios de sol. No Brasil, além de ser de graça e natural, é de boa qualidade. Mais uma vez, agradeci a Deus por abraçar aquelas pessoas queridas.

Na semana do Natal, fui ao supermercado comprar catorze cestas com alimentos para distribuir para o pessoal da limpeza e da segurança de meu prédio e, na véspera, pela manhã, pedi a todos que fossem ao meu apartamento buscá-las. Percebi que eles ficaram surpresos com meu gesto. Falaram-me que nunca, em muitos anos que lá trabalhavam, haviam recebido algo de outros moradores. Pensei comigo mesma que o importante não é fazer o que as pessoas fazem, e, sim, aquilo que alegra nossos corações. Foi com essa alegria que tive uma ceia de Natal maravilhosa junto com meus entes queridos. Participaram também de nossa ceia minha amiga Junia Melo, repórter da TV Bahia, e sua família, Madalena Lins Góes, uma pessoa que nasceu no Conde e se tornou minha amiga, um ser humano muito bonito, e Graça Coni, um amor de pessoa e querida amiga também.



Eu fui passar o Ano Novo no Conde com Litinha e muitas pessoas da família, além de Madalena e nossa também amiga Meire. Depois da entrada triunfante do novo milênio, fomos para a praia jogar rosas ao mar e oferecê-las a Iemanjá. Mais uma vez, agradeci-lhe pelas coisas boas que vinha me dando.

Durante o mês de janeiro, fiz uma consulta com um reumatologista na Clínica Arthros na Pituba. O médico estava muito confiante quando me disse que eu iria melhorar com o tratamento que havia me indicado: massagens, tense, um aparelho que emite choques elétricos na parte afetada da musculatura e do nervo, e hidroginástica. Comecei-o no dia seguinte e, mais uma vez, enchi-me de esperanças.

Chegou o dia do retorno de Adriana e seu filho para a Finlândia. Pela manhã, assim que ela acordou, percebi que estava com o olho inchado e vermelho. Disse para mim que iria ao médico porque, como o voo era muito longo, talvez necessitasse de um medicamento. O médico deu-lhe o remédio e um atestado dizendo que estava com conjuntivite. Recomendou que fosse à Varig e relatasse o que estava acontecendo. O funcionário da empresa disse-lhe que não via nenhum problema em ela embarcar porque isso era uma questão de estética e a empresa não estava preocupada com isso. No check in, uma pessoa viu seu olho e comunicou ao comandante imediatamente. Esse lhe avisou que ela não poderia embarcar, para sua própria segurança e a dos outros passageiros. O jeito foi voltar para casa e ficar pensando na falta de profissionalismo do funcionário que lhe disse que não havia problema em embarcar com conjuntivite. Passados alguns dias, já melhor, finalmente conseguiu embarcar para o Rio de Janeiro e, de lá, pegar o voo para Helsinki com escala em Londres. No Galeão, houve um contratempo:

– Senhora, gostaria de ver o papel da autorização do pai da criança. – disse o policial para Adriana no controle de passaportes.

Adriana, surpresa, respondeu-lhe:

– Senhor, isso é novidade para mim porque não moro no Brasil, a criança nasceu no exterior, e o pai dela está a nossa espera na Finlândia. Desde que saí de lá, ninguém, por nenhum momento, avisou-me sobre isso. Na verdade, não estou tirando a criança do pai, ao contrário, estou levando-a para ele. Desde pequena moro no exterior e nem sabia que teria que ter esse papel.

O policial respondeu-lhe que infelizmente não poderia embarcar sem o papel e disse-lhe também que, se conseguisse provar que a empresa aérea a qual os transportou não tinha avisado nada a esse respeito, a mesma teria obrigação de arcar com todas as despesas de sua permanência no Brasil até conseguir o citado documento.

Acredito que essa lei só seja aplicada para crianças que nascem no Brasil.

Estava assistindo ao jogo entre Brasil e Chile quando o telefone tocou. Do outro lado da linha, Adriana contava-me o que acontecera. Achei que era brincadeira dela. Disse-me também que a Varig havia se responsabilizado pelo ocorrido. Talvez a culpa maior tivesse sido da filial da mesma, na Finlândia, que não tinha informado minha filha sobre a autorização.

Adriana e seu filho foram acomodados no Hotel Luxor, no Aeroporto do Galeão, e, no dia seguinte, retornaram a Salvador e ficaram hospedados por oito dias no Hotel da Bahia, no Campo Grande, com todas as despesas pagas pela Varig, inclusive os telefonemas para a Finlândia. O pai da criança, junto com a embaixada brasileira em Helsinki, conseguiu, apesar da burocracia, enviar para Salvador a autorização.

Finalmente chegou o dia do embarque de Adriana e Jusef. Assim que Adriana acordou, falou-me que, durante a noite, lembrou-se de uma promessa que havia feito quando seu filho nasceu. Prometeu que, se seu filho melhorasse de uma alergia que tinha, quando ela viesse a Salvador, iria até as ruas entregar cem pães para crianças carentes. Havia se esquecido da promessa durante o tempo em que esteve em Salvador. Algum tempo antes do embarque, eu, Adriana e minha amiga Madalena fomos pagar sua promessa.

Eu continuava com o tratamento de minha coluna na Clínica Arthros. Não sentia muita melhora e, pelo contrário, quando saía de dentro da piscina, na aula de hidroginástica, tinha muitas tonturas. Resolvi parar porque estava gastando dinheiro à toa.

Decidi ligar para meu filho, que estava estudando em São Paulo, porque sua namorada era médica e poderia indicar-me outro tratamento. Fui aconselhada a tentar um tratamento novo no Brasil, chamado de RPG – Reeducação Postural Global. Indicou-me uma clínica no bairro da Graça em Salvador. No mesmo dia, liguei para essa clínica e acertei uma consulta para o início da semana seguinte. O médico viu meu exame de ressonância magnética e disse-me que eu tinha chances de melhorar com o tratamento de RPG. Na terceira sessão, eu estava muito animada porque sentia um pouco de melhora nas tonturas.

No dia 17 de abril, estava indo para a clínica, para mais um tratamento, quando, ainda dentro do táxi, meu celular tocou, e era Adriana ligando da Finlândia:

– Alô, minha mãe?! Estou ligando para saber como você está.

– Estou bem. – disse-lhe.

Em seguida, desligou. Achei estranho porque, quando ligamos uma para a outra, sempre temos muitas coisas a dizer. Na porta da clínica, estava pagando o táxi quando ela telefonou novamente. Nessa hora, dei-me conta de que havia algo errado.

– Adriana, está tudo bem? – perguntei-lhe.

– Minha mãe, gostaria de lhe dizer algo, mas queria que entrasse na clínica e se sentasse.

Foi com muita tristeza e emoção que ouvi Adriana dizer que Annikki, minha cunhada que estava doente, havia falecido no dia anterior, dia 16 de abril, data da morte de meu pai. O médico acalmou-me e aconselhou-me que voltasse para casa e descansasse.

Annikki Rutanem, minha cunhada

À noite, falei com meu marido pelo telefone, e a emoção foi muito grande. Jouko encontrava-se na Ilha de Java, na Indonésia, a trabalho, e precisou viajar às pressas para Estocolmo. Infelizmente não chegou a tempo. Pela primeira vez, senti imensamente não poder estar ao lado dele porque, depois de tudo que ele já tinha feito por mim, fiquei incapacitada de dar-lhe meu apoio.

Senti muito a morte de minha cunhada, pois ela era como se fosse minha irmã. Jamais me esquecerei do apoio e carinho que ela me deu quando fui para a Finlândia sem meus filhos. Eu havia falado com ela por telefone um mês antes de sua morte, e ela me disse que em nenhum momento passava por sua cabeça a ideia de que iria morrer. Era uma pessoa muito bonita principalmente em seu interior. Annikki era muito querida por todos da família, amigos e por aqueles que tiveram o privilégio de conhecê-la. Gostava muito de fazer jantares maravilhosos para seus amigos e era muito generosa com todos. Não foi casada e nem teve filhos, mas tratava os sobrinhos como se fossem filhos. É sempre uma pena perder uma pessoa como essa e não poder ter feito nada para aliviar seu sofrimento. Que Deus ilumine sua alma.

Na quarta-feira da Semana Santa, fui passar a Páscoa com minha irmã gêmea no Conde. Na Sexta-Feira Santa, estava ansiosa para ver a procissão do Senhor Morto, pois não a assistia havia mais de trinta anos. Em nossa adolescência, participávamos do cortejo e do coro também. Nesse dia, pela manhã bem cedo, tínhamos a tradição de nos ajoelhar e pedir bênçãos a nossos pais, avós, tios e padrinhos. Ficávamos em jejum até a hora do almoço. Tínhamos um respeito absoluto por esse dia santo, no qual éramos proibidas de varrer a casa, lavar os cabelos e até mesmo cantar ou ouvir músicas que não fossem religiosas.

Procissão do Senhor Morto

Estávamos sentados na varanda da casa de minha irmã quando meus sobrinhos, filhos de Jacira, chegaram, ajoelharam-se e pediram a bênção para mim. Fiquei surpresa em saber que ainda conservavam as mesmas tradições.

À tardinha, fomos para a porta da rua ver a procissão passar. O que assisti deixou-me um pouco surpresa e triste. Em frente ao cortejo do Senhor Morto, ou melhor, participando do mesmo, vinha, na frente, um carro de som fazendo propaganda política de um candidato à prefeitura. Isso me lembrou de quando morava em Salvador com Jouko, durante os anos oitenta, e, em um período de eleição, fomos ao Conde para que eu pudesse votar. Meu marido ficou impressionado com as brigas dos candidatos para se elegerem. Disse-lhe que aquilo que estava vendo era normal no Brasil, que a política brasileira não era saudável como a de seu país.

Retornei a Salvador a fim de dar continuidade a meu tratamento de RPG. Sentia que minha melhora era muito pouca comparada ao preço que pagava, mas tinha que continuar. Fazia quase cinco meses que estava longe de minha casa e de meu marido. Não podia interromper meu tratamento porque, mesmo que ajudasse pouco, era alguma coisa, e também as tonturas não me permitiam ir a lugar nenhum.

Jouko não tinha tempo de sofrer muito com minha ausência porque, durante esse período, viajou muito. Ele fez um projeto de um mês no México, uma conferência em Taipei, capital de Taiwan, e um projeto na Ilha de Java. Nós nos falávamos quase todos os dias pelo telefone.

No dia 25 de maio, foi feita a cerimônia de cremação do corpo de minha cunhada em Estocolmo. Em uma igreja finlandesa, ao lado do castelo onde mora a família real da Suécia, foi feita a cerimônia litúrgica. Lá estavam a família, seus amigos e os colegas da embaixada em que trabalhava. Jouko falou-me que a liturgia havia sido muito bonita e emocionante pelo fato de Annikki ser querida por todos que a conheciam. O funeral, ou melhor, o enterro das cinzas estava programado para o dia dezesseis de julho em Saarijärvi, na Finlândia, sua terra natal.

No início de junho, já me sentia um pouco melhor e finalmente fui à Varig. Marquei meu voo para o dia cinco de junho e paguei uma multa por ter perdido o bilhete de meu retorno à Finlândia durante meu último voo ao Brasil. Só me lembro de que sentia muita tontura no desembarque. A última vez que vi esse bilhete foi quando fiz o check in de São Paulo para Salvador. Talvez ele tivesse caído de minhas mãos ainda dentro do aeroporto, ou eu o tivesse deixado dentro da aeronave em nosso voo para Salvador. Apesar do esforço da Varig, o tal bilhete nunca foi encontrado.

No dia cinco, decolei de Salvador para chegar a São Paulo horas antes do voo para a Europa passando algum tempo no aeroporto com meu filho. Estava muito ansiosa e morrendo de saudades dele, pois fazia pouco mais de um ano que não o via. Depois de algumas horas com ele e sentindo ainda mais saudades, decolei para Londres às 22 horas. Nesse voo, consegui dormir, e isso me ajudou bastante na conexão para Helsinki. Meu marido estava à minha espera no aeroporto, e, dois dias depois, fomos para nossa casa de verão curtir nossas férias.

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