Antofagasta era uma cidade muito simpática e desenvolvida, apesar do regime de ditadura que lá existia. Também havia bons restaurantes, shopping centers, um sistema especial de irrigação para as rosas e flores dos diversos jardins e parques, uma feira livre e um mercado para peixes frescos e mariscos, abundantes naquele local. Mas o que tornava a cidade muito especial era o contraste das montanhas com o azul anil do Oceano Pacífico.
Shopping: Mall Plaza. Foto Skyscrapercity |
Foto Flickr by Fernando José Ignacio |
Centro. Foto Skyscrapercity |
Foto Flickr by alobos Life - Monumento Natural La Portada |
Dados sobre Antofagasta:
Tem cerca de 400.000 habitantes.
É a cidade mais rica do Chile e com uma melhor qualidade de vida, principalmente pela baixa taxa de desemprego existente.
É a quarta maior no Chile, depois de Santiago, Conce y Valpo.
Tem apenas um Shopping Center (Mall), Shopping Plaza Antofagasta.
Tem dois cinemas Cinemundo com 6 salas cada.
Chove apenas duas vezes por ano, assim, o clima é ameno, nem muito frio no inverno ou muito quente no verão.
Atualmente há um projeto para criar uma superfície ferroviária da cidade.
O estádio regional está sendo remodelado.
A cidade tem três praias artificiais.
O setor mais rico da cidade, onde estão todos os milionários chama-s South Gardens.
As torres mais altas são o edifício de escritórios Obelisco (22 andares) e a torre Ícone residencial (32 apartamentos).
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Em uma ocasião, fomos fazer um lindo passeio em família, porém, durante o trajeto, passando por regiões de difícil acesso, fiquei preocupada e com medo daquele lugar totalmente deserto sem uma folha ou alma viva. Falei para Jouko:
– Você tem certeza de que o caminho é esse? É muito montanhoso e estreito, mal dá para passar o carro.
Ele confirmou que o caminho era aquele mesmo porque um amigo finlandês já tinha estado lá e lhe ensinado direitinho. Continuamos. As crianças também estavam com medo. Em um dado momento, não acreditava no que estava vendo a nossa frente. Lá estava um oásis com lindas árvores verdes e, no meio, várias fontes e cachoeiras. Paramos o carro e descemos. O que vi jamais esqueci. Nessas fontes, havia vários índios vestidos, boiando na água, o que me fez pensar que estavam mortos. Queria voltar imediatamente, mas Jouko falou-me que não estavam mortos, mas, sim, boiando, prática relacionada aos rituais desses povos. Alguns minutos depois, eles acordaram, deram-nos boas-vindas e foram embora. Ficou no ar um mistério difícil de ser interpretado por pessoas que não conhecem a cultura deles. Passamos o dia todo por lá. Confesso que ainda fiquei um pouco receosa, mas procuramos nos divertir bastante tomando banho naquelas cachoeiras quentes e fazendo um bom churrasco. À tardinha, retornamos para casa.
Resort no Peru |
– Maria, será que é uma boa ideia você levar essas rosas para Antofagasta? Talvez, com a duração do vôo e com o calor, elas morram.
Olhei para ele, morrendo de rir, e respondi-lhe:
– Não morrerão porque são artificiais, de seda.
Ele me olhou surpreso, dizendo:
– Como artificiais? Comprei na floricultura hoje de manhã!
– Desculpe lhe desapontar, mas é verdade.
Jouko, sem jeito, não sabia o que dizer. Entendi que o tinham enganado na floricultura. Acho que estava com muita pressa de retornar ao hotel antes que eu acordasse para me entregar as flores junto com a bandeja do café da manhã, como é tradição lá em casa no dia das mães, todos os anos, junto com as crianças. Essas flores não eram naturais, eram de seda e tão delicadas e perfeitas que as guardo até hoje. Esse presente foi muito especial pela singularidade e delicadeza.
No final do ano, decidimos passar o Natal e o Ano Novo em Santiago. Saímos às quatro da manhã de carro e viajamos quase seiscentos quilômetros sem ver uma folha verde. À tarde, começamos a perceber umas plantinhas rasteiras e algumas flores do campo. Chegamos a uma cidade chamada Copiapo onde pudemos nos deliciar com plantações de uva. A partir desse ponto, já estávamos dentro de um verde imenso, com paisagens belíssimas. Descíamos e subíamos montanhas por uma pista bem conservada e sinuosa. Finalmente encontramos La Serena, cidade reconstruída em razão da destruição causada pelo último terremoto que tinha acontecido havia alguns anos. Em La Serena, fomos para o hotel onde havíamos feito a reserva e, à noite, saímos para jantar, conhecer a cidade e um pouco da história daquele local. No outro dia bem cedo, seguimos viagem para Viña del Mar, cidade-jardim à beira do Oceano Pacífico. Nós ficamos hospedados no Hotel O’Higgins no centro da cidade, famoso por hospedar artistas do mundo inteiro em razão do Festival da Canção, evento que acontece anualmente nessa cidade.
LA SERENA
La Serena - Downtown Cordovez Street |
La Serena downtown Cordovez Street. Foto Flickr by Steve e Carol |
La Serena - Flickr by Gustavo Arias |
VIÑA DEL MAR
Foto via Skyscrapercity |
Foto via Skyscrapercity |
Foto via Skyscrapercity |
Hotel O’Higgins, onde ficamos hospedados em Viña Del Mar Foto via Skyscrapercity |
Passamos o Natal no restaurante desse hotel, que serviu uma ceia maravilhosa. Visitamos Valparaíso, cidade portuária muito parecida com São Francisco, na Califórnia, onde permanecemos por três gloriosos dias indo à praia, visitando os pontos turísticos e comendo muitos frutos do mar. Seguimos viagem para Santiago, também ficando nessa cidade por três dias, visitando lugares bonitos e restaurantes típicos, como Los Adobes de Argomedo, um excelente restaurante típico que, além de ter uma boa comida e bons shows, homenageou-nos colocando as bandeiras do Brasil e da Finlândia em nossa mesa.
Valparaíso
Foto hosted on Flickr by Chris Weller |
Foto hosted on Flickr by Adriano Oliveira
Santiago
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Costanera Avenue - Foto by Skyscrapercity |
Foto via Skyscrapercity |
Nós, no restaurante Los Adobes de Argomedo
No dia seguinte, fomos às compras no centro de Santiago. Passamos por uma esquina de um calçadão e tomamos o melhor café que eu já havia tomado em um local chamado Café do Brasil, onde as garçonetes vestiam uniformes verde-amarelos. Estávamos passeando, olhando as vitrines e gostei de um conjunto de saia e blusa que vi. Entrei na loja e pedi para experimentar. Tirei minha roupa, ficando só de sutiã e calcinha. Comecei a abotoar a saia quando percebi que alguma coisa estava grudada em minha coxa. Não acreditava no que estava vendo: uma aranha asquerosa! Entrei em pânico. Saí correndo pelo meio da rua gritando e tentando me livrar da saia. Meu marido e as crianças vieram atrás de mim tentando me acalmar. Estava tão nervosa que nem percebi que a aranha já não estava mais grudada em mim. Os funcionários da loja pediram-me muitas desculpas. No dia seguinte bem cedo, começamos nossa viagem de retorno e paramos novamente em La Serena, onde, no hotel, tivemos uma linda festa de Ano Novo.
Nossa vida continuava feliz em Antofagasta, tínhamos muitos amigos que, a cada final de semana, nos convidavam para festas, jantares e recepções. Íamos também quase todos os domingos para o Clube de Campo onde Jouko jogava golfe. As pessoas da cidade, na maioria, conheciam-nos porque eu era a única brasileira a viver por lá. Aos sábados, eu ia ao mercado à beira do cais comprar peixes frescos, mariscos, frutas e verduras. Os garotos do estacionamento já conheciam meu carro e, quando eu me aproximava, eles começavam a dançar samba em minha frente, disputando uma chance de conseguir um estacionamento para mim.
jantando em casa de amigos em Antofagasta |
Um dia, fui surpreendida com a visita de uma jovem estudante que procurava emprego:
– Senhora Maria José, aí na porta está uma chica querendo falar com a senhora. – disse-me dona Ana, uma mulher que trabalhava lá em casa.
– Senhora, estou de férias da faculdade e, para ter um dinheiro extra, gostaria de trabalhar em sua casa por alguns meses. – falou-me a moça.
Achei a jovem muito simpática e educada e acertei que começaria no dia seguinte. Gostava dela, era uma boa cozinheira e fazia, além de outras comidas típicas chilenas, um peito de peru grelhado com purê de maçãs, regado com um molho feito com conhaque e vinho rosé, que era maravilhoso. Ela ainda sabia arrumar uma mesa para uma refeição formal, o que era quase rotina para nós, pois sempre tínhamos diretores da empresa de Jouko para jantar. Era muito requintada até quando batia na porta de meu quarto. No começo de seu trabalho, todas as noites, perguntava-me:
– Senhora, quieres una aguita?
Respondia-lhe sempre não, pois achava que me oferecia água. Como fazia isso todas as noites, resolvi perguntar para uma vizinha porque ela me perguntava tanto isso. Foi aí que fiquei sabendo que me oferecia chá com biscoitos feitos por ela.
No mês seguinte, fui ao banco com nossos cinco passaportes a fim de pagar a taxa de visto e tive uma grande surpresa:
– Senhora, dentro dessa pasta só tem quatro passaportes. – dizia-me o funcionário do banco.
– Olhe direito porque trouxe agora de minha casa os cinco: o meu, os de meus três filhos e o de Jouko. Sei que não perdi porque a pasta estava fechada.
– Desculpe, mas a senhora pode conferir.
Voltei imediatamente para casa com a esperança de lá encontrar meu passaporte. Qual não foi minha surpresa ao saber que a universitária que trabalhava comigo também havia sumido, com meu passaporte, é lógico! Minha primeira providência foi ligar para Jouko, que me orientou a ir imediatamente à polícia e uma busca foi acionada. O policial chileno, por sinal muito educado, chamou-me em uma sala e disse-me:
– Senhora, são 11h da manhã, e aconselho que entre imediatamente em contato com sua embaixada, pois é perigoso ficar aqui sem passaporte em razão do regime que temos. É lógico que faremos o possível para encontrar seu passaporte, mas não prometo nada porque esses casos são muito comuns aqui, e, na maioria das vezes, não encontramos os passaportes. Essa é uma organização de estudantes que não estão satisfeitos com o regime político e querem sair do país a todo custo.
Liguei para a Embaixada do Brasil em Santiago, falei com o cônsul e fui orientada por ele a tomar o primeiro vôo para lá. Talvez não desse tempo de dar-me o novo passaporte no mesmo dia, mas ele iria fazer o possível para o dia seguinte. Munida com a identidade brasileira, título de eleitor e carteira de motorista, tomei o vôo das 14h com destino a Santiago. Ao chegar ao hotel, telefonei para o cônsul, que providenciou, em seguida, uma pessoa para ir buscar minha documentação porque seria arriscado eu ir até a embaixada. No dia seguinte, eu já estava com o passaporte novo, meu seguro cobriu todas as despesas, e o meu antigo nunca mais foi encontrado.
Nesse período em que moramos no Chile, tínhamos como amigos um casal chileno com dois filhos adolescentes, Christofer, de quinze anos, e Christian, de dezessete. O pai deles também era engenheiro e trabalhava no mesmo projeto que Jouko. Todos os dias, os garotos passavam em minha casa para almoçar porque o colégio deles ficava perto de lá. Eu gostava da idéia porque, assim, ficavam mais tempo com meus filhos, que, apesar de serem mais jovens, se davam muito bem com os amigos. Certo dia, à tarde, eu estava sozinha em casa quando Christian chegou e disse que precisava falar comigo. Fomos direto para a varanda, sentamos e começamos a conversar. Quando olhei para ele, percebi que estava chorando.
– Que houve? Por que está chorando? – perguntei-lhe.
Ele olhou para mim e respondeu:
– Tia Maria José, eu estou chorando porque estou sofrendo muito em razão do imenso amor que sinto pela senhora, melhor dizendo, estou apaixonado. Não consigo dormir, estudar, comer... só penso na senhora.
Fiquei sem fôlego, chocada com essa revelação de uma criança que tinha idade para ser meu filho. Não sabia o que falar para ele, mas disse-lhe:
– Infelizmente não posso fazer nada por você porque o que você tem na cabeça é algo impossível. Vá para sua casa e diga a sua mãe que logo mais irei conversar com ela sobre isso.
Algumas horas depois, completamente transtornada com aquela revelação, fui à casa deles para tentar resolver essa situação embaraçosa. Lá chegando, tive a desagradável surpresa de saber que a mãe dele estava ciente de tudo e, pior ainda, estava apoiando o filho, pois queria que ele tivesse uma experiência diferente, segundo ela, com uma pessoa mais velha, chique, rica e elegante. Ao ouvir isso, senti uma espécie de repulsa, de nojo por aquela mulher sem escrúpulos. Foi o suficiente para me afastar deles. Segundo Jouko, o pai não sabia o que estava acontecendo. Pediu muitas desculpas pela família, e nunca mais os vi.
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