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Thursday, June 6, 2013

CONSTRUINDO UMA NOVA FAMÍLIA

Ainda quando morávamos no Brasil, Jouko sentiu, em determinado momento, minha aflição:


- Maria, porque está triste e pensativa? Posso fazer alguma coisa?

Não sabia o que responder, o motivo de tais pensamentos eram dívidas contraídas quando tinha um negócio de roupas. Na verdade, havia mais dinheiro para receber do que para pagar, mas quem me devia até evitava falar comigo. Então resolvi contar-lhe o que estava acontecendo, e ele me disse:

– Amanhã pela manhã você fará o levantamento da dívida e a liquidaremos.Também quero que você entre em uma autoescola para tirar sua carteira de motorista porque as aulas das crianças dentro em breve começarão e você vai precisar levá-las, não é mesmo?

Estava me sentindo uma verdadeira princesa em meio a tantas atenções e tantas coisas boas que um ser humano pode ter. Meus filhos já estavam entrosados com as crianças finlandesas cujos pais trabalhavam no mesmo projeto que Jouko. Viajávamos muito, passávamos finais de semana em ótimos hotéis e desfrutávamos de coisas antes impossíveis para mim e meus filhos.

Restaurante

Em um desses finais de semana, programamos um almoço para todas as famílias finlandesas que tinham vínculo com a mesma empresa em que Jouko trabalhava. Escolhemos um restaurante localizado em uma chácara na Estrada do Coco. Esses tipos de almoço ou jantar eram pagos pela empresa, mas Jouko, por ser o chefe, pagava e depois era reembolsado.Durante o almoço, a esposa de um dos engenheiros perguntou-me:

– Maria José, você não acha que esse lombo de porco está estragado?

Foto: Flickr by Marcelo Trasel
Concordei e, para minha surpresa e desgosto, todos também concordaram. Pedi muitas desculpas porque tinha sido eu que havia programado o almoço e escolhido o restaurante. Pedi, então, ao garçom que me levasse até o gerente ou dono para fazer a reclamação. Aproveitando a situação, Jouko assinou o cheque e entregou-me dizendo:

– Aproveite e pague logo a conta.

Não consegui conter a surpresa quando entrei no escritório do dono do restaurante. Sentado em uma cadeira, com a mesma demagogia e cinismo, estava o homem que, sem dó nem piedade, havia me demitido de um emprego quando eu mais precisava. Não consigo esquecer o seu olhar de espanto ao saber que eu era a organizadora daquele almoço, ou melhor, a mulher do homem que estava pagando a conta. Olhei para ele e disse:

– Sem comentários. Quero pagar a conta e lhe avisar que nem esses, nem outros finlandeses virão mais a seu restaurante.

Dito isso, preenchi o cheque, joguei-o em cima da mesa e retirei-me.

É, realmente Jouko era muito diferente de todos os homens que eu já havia conhecido. Com o passar do tempo, nossa relação ficava ainda mais fortalecida, até que ele me propos:

– Maria, o que você acha da ideia de termos um filho? Como sabe, minha família é muito pequena, resume-se a dois irmãos, duas irmãs, alguns tios e primos. É lógico que seus filhos também serão meus, sua família também, mas podemos tentar pelo menos um.

Não sabia o que dizer porque, como já mencionei, quando o conheci, já estava com problemas de saúde e, além disso, na última cesariana, havia feito uma laqueadura de trompas. Mas eu já tinha ouvido falar que talvez, com um bom tratamento, fosse possível ter outro filho. Também existia um problema, uma hemorragia menstrual, que, por algumas vezes, levou-me ao hospital. Comecei a visitar especialistas famosos em Salvador os quais não conseguiram resolver meu problema. Decidimos, então, ir até São Paulo procurar uma assistência melhor:

– Dr. Carmelito, quem está falando aqui é Maria José, cunhada de Edvaldo, seu irmão. Ele me deu seu telefone e disse que você, como diretor de um hospital daqui de São Paulo, poderia me indicar um bom especialista. Gostaria de falar com você pessoalmente. Quando seria possível nos encontrarmos?

Ao falar com o Dr. Carmelito, ouvi, de repente, uma voz de mulher gritando, dizendo para o marido que não me convidasse para hospedar-me na casa deles, pois não havia vagas. Foi aí que falei:

– Carmelito, o que acha da ideia de você e sua esposa virem até o hotel em que eu e meu marido estamos hospedados para tomarem um drinque conosco?

Algumas horas depois, nós nos encontramos no bar do hotel, e é lógico que a esposa dele já estava me tratando de outro jeito.

No outro dia à tarde, já estávamos assessorados pela esposa de Dr. Carmelito, no consultório de Dr. Antonio Jorge Salomão, um médico e professor da Universidade de São Paulo, que nos disse:

– Jouko e Maria José, tenho que ser honesto com vocês. É praticamente nula a possibilidade de terem um filho por causa dos resultados dos exames. Acho melhor que amanhã, logo pela manhã, Maria José seja internada para se submeter a uma cirurgia, pois ela tem um mioma no útero, e não podemos protelar mais.

Percebi o desapontamento de Jouko, mas, com sua bondade, deu-me muita força, dizendo-me que o mais importante naquele momento era minha saúde.

Foto: Flickr by Promatre Paulista
Fui internada no Hospital Pro-Matre e, por coincidência, fiquei instalada em uma suíte em que, alguns anos antes, a primeira esposa do cantor Roberto Carlos havia dado um filho a ele. Tive toda assistência possível. Carinho e flores frescas, Jouko não deixava faltar. Estava muito preocupada por não poder dar-lhe o filho tão esperado. Eu achava que nosso relacionamento iria, então, terminar, pois ele tinha toda a possibilidade do mundo de encontrar outra pessoa com a qual pudesse ter um filho. Quando eu ainda estava no hospital, em fase de recuperação, ele me disse:

– Maria, preciso retornar já no próximo mês para a Finlândia, pois o projeto está no fim, mas saiba que te amo muito e gostaria que, quando possível, você fosse ao meu encontro. Você pode ir sozinha, depois tentaremos levar as crianças.

Vou deixar dinheiro suficiente para as despesas de vocês até nos encontrarmos novamente.

Permanecemos por duas semanas em São Paulo até minha recuperação, depois retornamos a Salvador.

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