Continuei morando um pouco com meus pais e minha irmã; as casas eram perto uma da outra. Minha família nunca, por nenhum momento, deixou de me dar apoio. Eu estava provisoriamente separada de meu marido, não sabia por onde ele andava, nem o que estava fazendo, até que uma amiga me disse:
– Sabe quem encontrei em frente ao Mercado Modelo totalmente embriagado?
– Quem? – perguntei-lhe, vindo a descobrir que era meu marido. Fui buscá-lo em Salvador e, lá no Conde, com meu apoio e de minha família, diminuiu um pouco a bebida.
Alguns meses depois, sem beber e parecendo outra pessoa, viajou para Feira de Santana, cidade que fica a mais de cem quilômetros de Salvador. Ele finalmente tinha conseguido um emprego como chefe de compras em uma fábrica de pneus, com um bom salário e muitas vantagens por exercer um cargo de chefia. Logo nos mudamos para lá, indo morar em uma casa decente.
Feira de Santama, Bahia (Foto by Will_NE) |
Feira de Santana (Foto by Will_NE) |
Já estava grávida de meu terceiro filho, eu tinha um médico para o pré-natal e até carro com motorista para me levar a Salvador quando precisasse. Tudo estava perfeito, não nos faltava nada. Eu tinha uma boa empregada e um jardim maravilhoso. Minha família toda estava muito contente porque finalmente minha vida seguia tranquila.
Meu filho nasceu alguns meses depois, em uma clínica particular, de parto cesariana, e o médico já estava autorizado, caso fosse menino, a fazer laqueadura. Mas essa felicidade durou apenas mais um ano. De volta à bebida, meu marido foi demitido, e tivemos de nos mudar para uma casa mais simples. Tomei, então, a firme decisão de começar a trabalhar durante o dia e estudar à noite. Eu já tinha o segundo grau completo e, assim, resolvi fazer um curso técnico de Administração de Empresas.
Comecei a trabalhar em um hotel quatro estrelas como recepcionista. Com muita economia, conseguia, com meu salário, pagar o aluguel e alimentar meus filhos. Além do salário, nós, funcionários, tínhamos direito a comissão e alimentação, e eu sempre recebia boas gorjetas. Era muito duro porque trabalhava das sete da manhã às seis da tarde e tinha de estar na sala de aula às sete da noite. Não sobrava muito tempo para dormir. A sorte é que havia uma pessoa de minha confiança cuidando das crianças. Quanto ao meu marido, continuava procurando trabalho e afogando as mágoas na mesa de um bar. Estava muito difícil sustentar aquela situação até que, não suportando mais, pedi a ele que fosse embora.
Certo dia, eu fui chamada pelo gerente do hotel para receber dois ônibus de turismo vindos de São Paulo. A recepção estava lotada, e eu ajudava na acomodação dos novos hóspedes quando o telefone tocou. Era Rosa, a empregada de minha casa, avisando que Ricardo, de apenas um ano e meio, havia ingerido um pouco de querosene que estava dentro de uma garrafa no quintal. Larguei tudo que estava fazendo e corri para socorrer meu filho. Meus colegas gostavam muito de mim e conseguiram controlar a situação no trabalho. Levei meu filho a um hospital e telefonei para o pediatra dele que, por coincidência, era também filho do Conde. Houve uma pequena lesão pulmonar e uma distensão abdominal muito grande, mas meu filho teve uma ótima assistência e, depois de uma semana, já estava em casa.
Dois anos depois, separada de meu marido, consegui me formar em Administração de Empresas. Foi uma festa linda junto com a minha família. Continuava trabalhando no hotel, não mais como recepcionista, mas no Departamento Pessoal porque a empresa havia me oferecido um curso gratuito que ensinava como elaborar folha de pagamento, cálculo de férias e décimo terceiro salário, impostos, auxílio doença, rescisões de contrato e outros.
Passado mais um tempo, fui convidada a trabalhar em uma fábrica de materiais elétricos em São Paulo para chefiar o setor de compras, com o dobro do salário do hotel. Quando estava começando a ter minha independência profissional e financeira, meu ex-marido tornou a me procurar:
– Dona Maria José, chegou esse envelope pelo correio para a senhora. – disse-me Conceição, uma moça que trabalhava comigo no Setor de Compras de meu novo emprego em São Paulo.
Abri o bendito envelope, que continha quatro bilhetes aéreos e uma carta de meu ex-marido cheia de esperanças para uma nova vida.
Pedi demissão do emprego e novamente segui para o Rio Grande do Sul, dessa vez, levando minha irmã mais nova.
Eu já havia me instalado, quando comecei a trabalhar na empresa de meu cunhado, também no Departamento Pessoal. Meu marido estava trabalhando lá, porém em outro setor. Mas a situação entre nós não estava nada boa, pois ele não havia se livrado realmente do vício.
– Zeinha – dizia-me minha irmã Regina –, vá dormir antes que seu marido chegue, para evitar brigas novamente.
– Não, Rege. Tenho esperanças de que hoje ele chegue lúcido e possamos conversar. Hoje, pela manhã, ele prometeu que não iria mais beber – dizia eu esperançosa.
Nem cheguei a concluir a frase direito quando senti em minhas costas uma forte dor em razão de um pedaço de pau que ele havia atirado em mim. Esse acontecimento foi a gota d’água para que eu me desse conta de que estava ali somente por pena dele. Na mesma noite, liguei para a mãe dele e falei que não tinha mais volta e que estava com a consciência tranquila porque eu já havia feito tudo que estava ao meu alcance para salvar nosso casamento.
Ela concordou comigo. Pedi ajuda a meu irmão, que já estava morando em Porto Alegre, para comprar nossas passagens de volta a Salvador.
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