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Monday, May 27, 2013

Conde, o início da Trilha (parte2)


Em outra situação, fomos brincar na lagoa chamada Passaginha, na qual gostávamos muito de nadar. Lá, tomávamos banho, lavávamos nossas roupas e passeávamos de canoa. O fofoqueiro da cidade, chamado Sinhozinho, que não tinha o que fazer, vivia vigiando nossos passos e contava para papai tudo que fazíamos. Dedurou-nos quando pegamos a canoa de papai sem lhe pedir. Como se não bastasse, perdemos todos os camarões que havíamos ido lavar na lagoa. Quando vi papai, fui logo me desculpando:

– Pai, por favor, desculpe-me! Os porcos comeram todos os camarões que levamos para lavar na lagoa. Litinha me convenceu de pegarmos a canoa para darmos uma voltinha na Passaginha, e quando voltamos o cesto estava vazio.

E papai, furioso, perguntou:
– Onde está sua irmã?

Ao mesmo tempo, minha irmã chegava com um pote cheio de água na cabeça.


representação do pote de água na cabeça (foto: via google)

Enquanto batia nela, papai lhe dizia:
– Se você derrubar esse pote, vai apanhar em dobro.

Minha irmã, heroicamente, manteve o pote na cabeça. Logicamente, também recebi minha punição.

Nesse mesmo período, foi com tristeza que mamãe recebeu a notícia da morte da irmã de papai que vivia na roça e não tinha nenhum recurso. Não resistiu à complicação que teve durante o parto do quarto filho, essa foi causada por uma hemorragia. Depois que a criança nasceu forte e saudável, ela veio a falecer. Além de ser minha madrinha, era como se fosse uma irmã querida para mamãe. O principal motivo dessa grande amizade era que ela tinha sido a única das irmãs de papai, melhor dizendo, a única de sua família que ficou ao lado deles quando se casaram. Meus pais saíram imediatamente para o funeral após a notícia, a cavalo, porque era o único meio de transporte que tinham. Mamãe demorou bastante para se recuperar dessa imensurável perda.

Nessa mesma época, nós estávamos todos reunidos na sala de jantar, mas papai não estava presente, pois havia ficado no armazém, quando algo ruim nos aconteceu. Minha mãe tinha uma irmã, tia Edmeia, que morava desde mocinha na capital da Bahia e tinha vindo nos visitar depois de muitos anos ausente. A alegria era geral até que foi interrompida pelos gritos de uma cunhada de mamãe. Corremos todos para a porta de casa e vimos papai caído em uma poça de sangue, com um ferimento no braço esquerdo. Havia levado uma facada de um homem que era seu rival na política, uma vez que papai era cabo eleitoral de outro político. Só não foi morto porque, na hora em que foi jogada a faca, papai defendeu-se com o braço, mas, mesmo assim, o ferimento foi muito profundo, derrubando-o. Até então, não havíamos conhecido o sofrimento. A cunhada de mamãe chegou exatamente na hora em que o homem estava tentando pular o balcão e terminar de matar nosso pai. 

Quando ela gritou, o homem correu. O hospital mais próximo era distante cinquenta quilômetros da vila por estrada de terra, e o único meio de transporte era um jipe velho que andava a apenas quarenta quilômetros por hora. Ele foi socorrido somente algumas horas depois, pois não encontramos o dono do jipe para transportá-lo. Quando conseguimos o transporte, papai foi levado para o hospital em Esplanada, uma cidade próxima à nossa. Chegando lá, o médico disse para mamãe que não havia muita chance de sobrevivência já que ele havia perdido muito sangue. Tínhamos muita fé em Deus, e isso nos ajudou bastante a não perdermos as esperanças. Depois de alguns dias no hospital, papai retornou para casa e, aos poucos, foi se recuperando. O criminoso fugiu. Naquela época, o trabalho da polícia era muito precário, pois, além da falta de preparo, existia a falta de transportes. O caso foi encerrado, a impunidade permaneceu, e, muitos anos depois, soubemos que o criminoso estava paralítico em cima de uma cama. Teria sido feita a justiça? 









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