Pages

Friday, July 5, 2013

FORMATURA DE ADRIANA E CASAMENTO DE ANAPAULA

Na volta à Finlândia, em março, decidi descer em Paris e ficar três dias para apreciar, mais uma vez, a beleza daquela cidade. No segundo dia em que lá estava, fui ao Champs-Élysées, em uma loja que estava vendendo as camisas originais da copa do mundo de futebol. Comprei algumas e acessórios para a nossa torcida. Fui almoçar em um restaurante ali perto, depois, fui ao Louvre, fiz algumas compras e retornei ao hotel. No dia seguinte, quase perdi o avião após ter enfrentado um tráfego terrível do centro para o aeroporto.


Champs Elysees, ao entardecer - Arco do Triunfo (Foto by Stacey Walker via flickr)

Avenida Champs Elysees, Paris (Foto by Triplen01 via flickr)

Champs Elysees, a noite (Foto by Mohamed Amine via flickr
Museu do Louvre - Paris (foto by julien.H via flickr)

Jouko estava à minha espera. Depois de dois dias de nosso encontro, voamos para Estocolmo, onde ele ia fazer um projeto de dois meses. Fiquei com ele apenas por duas semanas. No domingo, fomos almoçar com a irmã de Jouko, que morava em Estocolmo. Ela, como sempre, ficava muito feliz ao ver-me e não sabia o que fazer para nos agradar. O fato de ela morar em outro país, longe da família, fazia com que sentisse a carência de estar com alguém conhecido. Preparou-nos um almoço maravilhoso, conversamos bastante, tomamos vinho e licor. Antes de nossa saída, no final da tarde, ela me emocionou com um presente pelo meu aniversário que seria dentro de alguns meses: uma floreira de cristal sueco chamado kosta boda, o qual está entre os melhores cristais do mundo. Adorei! Só não podia imaginar que seria a última vez que a veria.

Retornei à Finlândia porque estava na hora de pensar nos preparativos para a festa de casamento de Anapaula e da formatura de Adriana que seriam dali a três semanas. Adriana estava formando-se em inglês.

Antes de qualquer coisa, comprei, em uma academia de ginástica do centro da cidade, um pacote de três meses de aulas. Eu já sentia falta de exercitar-me. Mas errei ao ter começado esse programa sem o acompanhamento de um profissional, pois tive que interrompê-lo por ter me causado tonturas e dores de cabeça constantes.

Adriana já estava morando com o namorado em um apartamento no centro de Helsinki, e decidimos que faríamos sua festa na casa dela já que convidaríamos apenas algumas pessoas. Pela manhã, houve a cerimônia na escola de língua inglesa. Durante a festa, dei-lhe um anel de rubis e brilhantes. À noite, fomos comemorar em um restaurante no centro de Helsinki. Jouko já havia retornado da Suécia e estava conosco. Eu me sentia realizada. Consegui que todos os meus três filhos tivessem uma excelente educação e falassem quatro línguas fluentemente. E Ricardo, atualmente, domina cinco línguas.

Formatura de Adriana




Logo depois, começaram os preparativos para o casamento de Anapaula, pois faltava apenas um mês e meio para este grande dia. Eu mesma não sabia por onde começar porque já estava muito estressada. Não é todo dia que se casa uma filha, principalmente a mais velha e a primeira a assumir esse compromisso. Ficávamos até tarde da noite fazendo as lembrancinhas para os convidados. Eram umas bolsinhas com dois tipos de tecido: o de dentro, de cetim amarelo claro, e o de fora, tule dourado. Depois de cortados, eram colados nas laterais, fechados e amarrados com uma fita dourada, com a qual se dava um laço que prendia um arranjo com pequeninas flores-do-campo de cera. Dentro da bolsinha eram colocadas três balinhas de caramelo. Teríamos que fazer em torno de duzentas e cinquenta lembranças.

Anapaula decidiu que ela mesma iria fazer os convites. Deu um pouco de trabalho, mas finalmente encontramos o tipo de papel e outros materiais que seriam usados, além das aliancinhas douradas que seriam colocadas na capa junto com um arranjo de flores secas.

É tradição, na Finlândia, os noivos receberem dinheiro como presente de casamento, e, para isso, foi aberta, no banco, uma conta cujo número constava na última página do convite. Depois de prontos e enviados todos os convites, começamos a pensar na festa de despedida de solteira, que seria na semana seguinte. Como manda a tradição, a noiva sai às ruas vestida com roupas bem engraçadas para chamar a atenção das pessoas e arrecadar dinheiro.

Adriana telefonou para Anapaula e perguntou:

– Amanhã é sua despedida de solteira. Você já sabe o que vai fazer?

Ela respondeu que não tinha nenhuma ideia. E Adriana falou:

– Pela manhã, passo aí em sua casa com minha mãe, e vamos para algum lugar almoçar. Temos conosco a roupa oficial do jogador Ronaldo e gostaria que você a vestisse porque amanhã é o primeiro jogo do Brasil na Copa, contra a Escócia. Temos lugares reservados no City Maraton e, logo mais, à tarde, iremos para lá.

O City Maraton é um restaurante no centro de Helsinki. E lá, começamos a nos divertir:

– Anapaula, gostaria que pusesse essa venda em seus olhos. – dizia Adriana.

Àquela altura, Anapaula, que já estava vestida com a roupa do jogador brasileiro, sem entender o que iria acontecer, vendou seus olhos, e nos dirigimos para fora do prédio. Ela me perguntou onde estava meu carro, e eu respondi que o havia deixado em casa e que iríamos sair de táxi. Dentro do carro, abrimos uma garrafa de champanhe e servimos uma taça para ela, que continuava sem entender nada. Nessa hora, tiramos sua venda, e Anapaula não conseguiu conter a surpresa quando percebeu que estávamos dentro de uma limousine com mais três amigas. Servimos para ela canapés de caviar, e também não podia faltar a música brasileira. O chofer estava vestido a rigor, e, na frente da limousine, havia duas bandeiras: uma da Finlândia e outra do Brasil. Durante uma hora, percorremos as ruas de Helsinki, tomando champanhe, ouvindo música brasileira e tirando fotos. No final de nosso passeio, mais uma surpresa. Em um ponto da cidade, estavam mais vinte amigas à nossa espera para continuarmos a brincadeira. Deixamos a limousine e seguimos andando pelas ruas. Não é preciso dizer que éramos o centro das atenções, todas vestidas com a camiseta da Seleção Brasileira, principalmente Anapaula, que vestia a roupa do jogador Ronaldinho.

Festa da despedida de solteira de Adriana - dentro da limousine
Na rua, minha filha tinha que parar um homem, esse deveria jogar futebol com ela, além de lhe dar uma quantia em dinheiro, recebendo, em troca, como prêmio, uma bandeirinha do Brasil que havia sido feita por nós dias antes. Além das lembranças que estávamos fazendo para o casamento, também confeccionamos duzentas e cinquenta bandeirinhas brasileiras de papel para esse dia da despedida.

Ao meio-dia, paramos em um restaurante para almoçar, e tudo era motivo de festa, principalmente porque a maioria dos finlandeses estava torcendo por nossa seleção. Anapaula tinha o rosto pintado com a bandeira do Brasil e, em suas costas, levava uma placa de papelão escrita em finlandês: “Vou me casar”.

Às 14 horas, em plena euforia de nossa brincadeira, meu celular tocou. Era uma pessoa da televisão, do canal MTV 3, querendo saber onde estávamos porque queria fazer algumas imagens de nossa festa e também estar conosco na hora do jogo. Passava de uma hora que havia falado ao telefone com o repórter da TV, quando eles se aproximaram e começaram a nos filmar. Fizeram uma entrevista com Anapaula e ficaram conosco até a hora do jogo para filmarem nossa reação com os gols, pois estávamos a caminho do “penta”. Às 22 horas, mostraram as imagens na TV.

Depois de dois dias, Jouko foi mandado para a Indonésia para uma conferência da qual retornaria antes do casamento. Acordei um pouco mais cedo para tomar o café da manhã com ele, que estava saindo para o aeroporto, embarcando para Frankfurt e, de lá, tomaria o avião para a Indonésia. Falei para ele que não tinha conseguido dormir direito na noite anterior por ter sentido uma forte dor de cabeça. Ele me disse que, se persistisse, eu deveria ir ao médico.

Os dias passavam, eu continuava a fazer minha ginástica e estava envolvida com os preparativos do casamento. Certa vez, estava em uma loja comprando tecidos para as toalhas das mesas da festa quando senti minha cabeça rodar. Foi uma tontura tão forte que acabei me sentando. Fiquei muito assustada e, no mesmo dia, procurei o médico.

– Senhora Maria José, acredito que suas tonturas e dores de cabeça são consequências do estresse que está vivendo por causa do casamento de sua filha. Vou receitar um tranquilizante e gostaria que a senhora descansasse o máximo possível. – disse-me o médico.

Comecei a tomar o tranquilizante e, pelo menos, conseguia dormir melhor. Decidi, então, parar a ginástica porque, além de sentir muita tontura, corria contra o tempo. Faltavam poucos dias para a cerimônia, e estávamos tentando terminar as toalhas das quatro mesas grandes: uma para os doces, o bolo e as lembranças; uma para as comidas quentes; uma para os noivos; e, finalmente, uma para a família dos noivos. O tecido das mesas seria de cetim amarelo claro, com o acabamento de tranças de tule dourado. As mesas dos convidados seriam forradas também com o mesmo tecido, e, em cima delas, colocaríamos arranjos de rosas naturais amarelas. Os doces estavam sendo feitos em minha casa, e, para o preparo da comida quente, a mãe do noivo conseguiu uma cozinha industrial. O bolo, com cinco andares, seria encomendado fora.

Eu estava ansiosa, esperando a ligação de Ricardo, que estava no Brasil e chegaria à Finlândia na véspera do casamento. E também estava preocupada porque Jouko não conseguia livrar-se dos compromissos na Indonésia e retornar à Finlândia. Minha sorte era a de que tinha, na Finlândia, minha grande amiga Paula, uma portuguesa casada com um finlandês, que estava direto em minha casa me ajudando. Eu tinha também a ajuda de Adriana e Mohey. Na véspera, contei ainda com a ajuda de um casal de amigos, de duas brasileiras e de algumas amigas de Adriana. Recebi, no meio dessa confusão toda, um telefonema de Jouko:

– Maria, sinto muito, mas, infelizmente, não vou poder estar aí para o casamento de Anapaula, pois preciso ainda ficar aqui por mais uma semana.

Não conseguia esconder minha tristeza e desapontamento por não ter a presença tão preciosa de uma pessoa que vinha, ao longo desses anos, dedicando-se a mim e à minha família, principalmente a meus filhos, os quais criou e deu o melhor possível, com uma educação de primeira, preparando-os para um futuro brilhante. Jouko pediu-me que aceitasse essa situação porque era o trabalho dele e não podia fazer nada quanto a isso.

Faltavam dois dias para o casamento quando Ricardo me ligou do Rio de Janeiro avisando que estava saindo para Madri e, de lá, trocaria de avião, chegando a Helsinki às sete da noite do dia seguinte. Às sete horas em ponto, eu me encontrava no aeroporto esperando a chegada de meu filho, já bastante ansiosa e morrendo de saudades, pois não o via havia mais de seis meses. Ele havia me dito que estaria no voo da Ibéria, empresa aérea espanhola. Quando olhei o painel eletrônico e vi que a aeronave já estava no solo, corri para o desembarque. Os minutos passaram-se, e ele não apareceu. Tomei conhecimento de que aquele voo era o último vindo de Madri, e o próximo seria no dia seguinte, dia do casamento. Além de ficar preocupada por ele não ter aparecido, se chegasse no dia seguinte, não daria tempo de comprar sua roupa. Decidi retornar para casa.

É fácil imaginar como eu estava nervosa e cansada. Nas últimas noites não havia dormido direito em função de tanto trabalho, e, somado a tudo isso, havia ainda meu problema de saúde. Em casa, fui aconselhada por minha amiga Paula a telefonar para a Ibéria, em Madri, dar o nome de Ricardo e saber o que tinha acontecido:

– Senhora, nosso voo chegou atrasado do Rio de Janeiro, e os passageiros que iriam fazer conexão para outros países terão que esperar até amanhã. No momento, eles se encontram no hotel que a companhia aérea conseguiu. – informou-me um funcionário.

Liguei para o hotel, e a resposta que recebi foi de que não havia nenhuma pessoa hospedada lá com aquele nome. Entrei em pânico. O que teria acontecido? Liguei para o Rio de Janeiro, para o telefone de Ricardo, e ninguém atendeu. Passados alguns minutos, o meu tocou, e, como uma benção dos céus, ouvi a voz de meu filho:

– Minha mãe, estou no aeroporto de Helsinki. Você poderia vir me buscar?

Saí correndo como louca. Não via a hora de abraçá-lo e saber o que havia acontecido. Na volta para casa, ouvi atentamente sua história:

– Quando desembarquei em Madri e me dei conta de que já havia perdido meu voo, fui direto para a Finnair e expliquei minha situação. Disse que, no dia seguinte, minha irmã iria se casar, que havia feito uma música especialmente para tocar na hora da cerimônia e que tocaria também na banda que animaria a festa. Eles falaram que tinha um voo saindo e que havia lugares, mas meu bilhete não poderia ser trocado por um de outra companhia aérea por causa da tarifa que havia pagado. Por sorte, a pessoa entendeu minha situação e deixou-me embarcar. Não houve tempo de ligar para te avisar.

Tínhamos somente uma hora para alcançar as lojas abertas e comprar sua roupa. Não perdemos tempo e, antes de irmos para casa, fomos ao shopping. Na volta, dei o carro para ele e pedi que fizesse coisas na rua, como, por exemplo, buscar, no outro lado da cidade, uma parte das comidas.

Começamos a fazer os sessenta arranjos que seriam colocados em cima das mesas dos convidados. Cada arranjo continha cinco rosas amarelas e dois tipos de folhas verdes. Teria que estar tudo pronto até o amanhecer. O bom é que, nesta época, na Finlândia, é verão, e quase não temos noite, ou seja, o sol fica baixo à meia-noite e, depois da duas da manhã, começa a brilhar de novo. À medida que fazíamos os arranjos, colocávamo-los na varanda e, ao mesmo tempo, fazíamos o resto dos doces e algumas comidas, como salada e tira-gosto. Minha casa estava cheia de gente que me ajudava.

Pela manhã, levei Anapaula ao salão. Ela ia passar o dia por lá, fazendo cabelos, manicure, maquiagem e também sairia de lá já vestida, pronta para a igreja. Às 9 horas, depois que a deixei, fui a uma loja comprar o CD que continha a música a ser tocada na igreja na hora da entrada.

Comprei o disco e subi mais quatro andares pela escada rolante para comprar uma abotoadura para Ricardo. Quando abri a bolsa para pagar, percebi que minha carteira contendo todos os cartões de crédito, carteira de motorista, carteira de identidade, enfim, todos os meus documentos, além de dinheiro, havia desaparecido. Respirei fundo e tentei não entrar em pânico porque sabia que, se um finlandês a encontrasse, entregaria para a segurança da loja. O problema era que não havia tempo a perder, portanto retornei para o andar em que havia comprado o CD e a vendedora falou que eu havia pagado o CD e colocado de volta a carteira na bolsa. Como era possível se, depois desta compra, não havia passado em outro lugar? Uma moça vestida com um uniforme de segurança estava ao meu lado e me perguntou por quais lugares eu havia passado. Disse-lhe que não havia passado em outro lugar, então, ela sugeriu que retornássemos ao último lugar em que estive. Concordei, mesmo sabendo que não estaria lá. No meio do caminho, ouvi alguém chamar meu nome pelo autofalante. Era do setor de achados e perdidos. Minha carteira estava lá. O que aconteceu, na verdade, foi que, enquanto estava escolhendo as abotoaduras, tirei a carteira da bolsa e coloquei-a em cima do balcão distraidamente. Acho que foi a pressa e o cansaço.

Já estava atrasada para a floricultura, teria que estar lá às dez horas para pegar o buquê da noiva e das daminhas. O buquê continha rosas naturais amarelas e laranjas e algumas folhas pintadas de dourado. Apanharia também as rosas para os vasos da decoração do salão e das mesas, além das rosas para o cabelo da noiva, também amarelas e laranjas. Depois que coloquei tudo no carro, dirigi-me para o salão de beleza onde Anapaula estava para entregar-lhe as rosas do cabelo e o buquê. Retornei para casa porque ainda ajudaria a fazer os arranjos para o carro que levaria a noiva à igreja. Chovia muito. Não havia visto chover tão forte e continuamente desde que passei a morar na Finlândia. Era quase meio-dia, e teria que sair para o salão de beleza já que tinha hora marcada. Pedi, então, a Ricardo que fosse levar os arranjos das mesas e a comida para o salão da festa, depois ele voltaria e me levaria para lá. Como ele não havia aparecido na hora marcada, liguei para seu celular, e ele me disse que a polícia o havia parado por excesso de velocidade e, como não havia tempo a perder, pediu-me que fosse de táxi. Depois que ele resolvesse esse problema da multa, iria encontrar-se com Serginho, um músico brasileiro que estava passando uma temporada na Finlândia e que iria cantar a Ave-Maria em alemão assim que terminasse a troca de alianças. Tinha que ensaiar com ele.


Saí do salão por volta das 14 horas, voando, pois ainda teria que decidir a posição das mesas, ajudar na decoração e saber se a comida estava em ordem. Quando lá cheguei, encontrei uma verdadeira correria das pessoas que estavam me ajudando com a instalação de tonéis de cerveja, o gelo, os microfones e a parte elétrica (tudo sendo testados no palco).

Mandei uma pessoa colocar, na rua principal, próxima ao salão, grandes corações de cartolina em que os nomes dos noivos estariam escritos com pequeninas rosas de seda, indicando a direção do salão da festa.

Depois de tudo pronto, teria ainda que ir à igreja decorar os bancos e o altar. Tinha apenas uma hora para fazer isso e voltar para terminar de me arrumar em casa. A chuva não parava. Por mais que tivesse ajuda e corresse muito, sabia que seria impossível estar na igreja às 17 horas. Éramos quatro pessoas na igreja prendendo os arranjos nos bancos. O telefone tocou, e era Anapaula desesperada porque eu havia prometido para ela que a buscaria. Ela teria que sair do salão naquele instante porque os donos, o cabeleireiro e a maquiadora iriam também para o casamento a fim de dar assistência a ela e precisavam se aprontar. Havia passado vinte minutos do horário prometido. Disse-lhe que ligasse para outra pessoa ou chamasse um táxi, pois não havia mais tempo. Quando cheguei a minha casa, eram quase 17 horas. Anapaula também chegou ao mesmo tempo. Era realmente impossível estar na igreja às cinco! Arrumei-me num piscar de olhos.

Usei um chapéu bege de tecido acetinado com detalhes em tule, vestido longo de cor vinho, sapato bege combinando com o chapéu, colar de pérolas e brinco também de pérolas com rubis.

Como falei antes, a chuva não dava uma trégua e eu estava preocupada com os arranjos de flores naturais que decoravam o carro, um Ford Mondeo azul-escuro, que seria dirigido pelo noivo de Adriana.

Chegamos à igreja às 17h25min. Estava lotada, pois, como é típico na Finlândia, as pessoas são pontuais. Estavam lá desde as cinco. Na porta da igreja, eu segurava algumas rosas porque teria que colocá-las na lapela do amigo de Anapaula que entraria com ela, na de meu filho e na de Serginho, o rapaz que iria cantar a Ave-Maria.

Uma pessoa entrou discretamente na igreja a fim de colocar, nos assentos de cada convidado, os saquinhos de arroz feitos com cetim e amarrados com fitinhas douradas já que não havia dado tempo de fazer isso antes.

Tudo pronto, chega a hora da entrada da família dos noivos e, como meu marido estava ausente, entrei com meu filho, Adriana, com seu noivo e, depois, os padrinhos. Juha, o noivo de Anapaula, entrou acompanhado de seu bestman, uma espécie de guarda de honra.

Não conseguia controlar a emoção quando, finalmente, indescritivelmente linda, com um lindo sorriso nos lábios, entrou Anapaula, acompanhada do amigo, embalada pela música Jesus, alegria dos homens, de Bach. Na frente deles, um casal de crianças carregando as alianças, e, atrás, uma dama de honra, a qual cuidava do vestido.

A cerimônia foi celebrada em inglês e finlandês por um padre mulher, coisa inédita para mim. Uma menina de nove anos, cantora profissional, emocionou a todos quando cantou uma música da cantora canadense Céline Dion. Mas a emoção maior foi quando, depois da troca das alianças, Ricardo começou a tocar em seu violão a Ave-Maria, cantada em alemão por Sérgio, o músico brasileiro. Não consegui conter as lágrimas.

Na saída da igreja, os noivos receberam a chuva de arroz enquanto algumas pessoas, inclusive eu, procuravam um lugar para conseguir uma boa foto.

A chuva insistia em cair. Eu queria chegar antes do que os convidados ao salão de festa para ver se estava tudo em ordem e segui para lá com Paula, minha amiga, que estava sempre ao meu lado, ajudando-me em tudo. Depois de alguns minutos de nossa chegada ao salão, não acreditava no que via. A quantidade de pessoas chegando era inacreditável. Fui ficando nervosa porque havia mesas e cadeiras para duzentas pessoas, e, pelo que via, algumas pessoas ficariam de pé. Paula não perdeu tempo e, não sei de onde, conseguiu mais cadeiras. No final, todos puderam ficar sentados.

Os noivos chegaram e foram acomodados em sua mesa, onde havia um grande arranjo de rosas amarelas e laranjas combinando com o buquê e o enfeite do cabelo da noiva e duas bandeiras, a do Brasil e a da Finlândia. Lá estava também o presente especial que lhes dei: duas taças de champanhe com o nome dos noivos e a data do casamento gravados em ouro. Logo no começo da recepção, Ricardo lembrou-me:

– Minha mãe, eu, você e os pais do noivo teremos que ficar de pé para o ritual dos cumprimentos dos convidados.

Olhei e vi as pessoas fazendo fila, enquanto o bestman do noivo, acompanhado por outra pessoa, enchia de champanhe as taças dos convidados na fila. No meio dos cumprimentos, já comecei a sentir o cansaço tomando conta de mim, mas não podia, de jeito nenhum, demonstrar, pois a festa estava apenas começando. Os cumprimentos estenderam-se por muito tempo porque, além de ter muita gente, os convidados sempre demoravam falando com os noivos. Para meu desespero, olhava e via a fila imensa, parecia que nunca ia acabar. Depois dos cumprimentos, já no palco, chegou a vez dos discursos, o meu, o do bestman e o do noivo. Foi quando falei:

– Senhoras e senhores, não tenho palavras para descrever toda a emoção que estou sentindo por tê-los aqui comigo compartilhando essa alegria. Meu coração dói por não estar aqui o homem que fez com que toda essa alegria fizesse parte de minha vida, além de outras pessoas, também queridas, que estão longe nesta hora. Agradeço, por fim, a todos aqueles que me ajudaram a realizar essa linda festa e desejo toda a felicidade do mundo para os noivos!

Falei em inglês porque havia muitos convidados que não entendiam finlandês, como, por exemplo, uma modelo, amiga de Anapaula, que veio da Espanha para a festa.

Casamento de Anapaula


As pessoas tomavam drinques e se serviam de salgadinhos enquanto esperavam o prato quente.

A mesa onde seria servido o jantar estava decorada com um grande vaso de bronze que continha quarenta rosas amarelas e com dois candelabros grandes, também de bronze, com velas amarelas. Os guardanapos eram brancos com desenhos dourados.

Foram colocadas na mesa as travessas contendo: lombo de porco assado, rosbife defumado, peru assado, peito de frango defumado, salmão grelhado e defumado, lombo de boi com vegetais, salada de camarão, salada tropical, salada verde, arroz e batatas cozidas. Havia ainda vários tipos de pães, manteiga, arenque à moda finlandesa, geleia de puolukka, uma frutinha silvestre da Finlândia que acompanha todos os tipos de carne vermelha, e uma grande variedade de molhos: de cogumelo, cogumelo silvestre, camarão, mostarda e creme francês.

Enquanto isso as pessoas jantavam, divertiam-se com a orquestra Los Caipirinhas, um grupo musical formado por rapazes finlandeses que tocavam música brasileira. Eles eram amigos de meus filhos e ofereceram aos noivos, como presente de casamento, mais de sete horas de música. Ricardo também participava tocando guitarra e fazendo a apresentação do show, melhor dizendo, comandando a festa, talento dele, até então, por mim desconhecido.

Segundo a tradição finlandesa, durante a festa de casamento, alguém aparece no salão e rouba a noiva. O noivo, para tê-la de volta, precisa fazer algum tipo de brincadeira determinada pela família da noiva. Um amigo dos noivos tirou Anapaula do salão, e Ricardo disse ao noivo a tarefa que teria que cumprir: dançar samba, tocar algum instrumento e cantar alguma música brasileira, em português, é claro. Ajudado pela torcida, fez tudo que lhe haviam mandado. Então, Ricardo falou ao noivo:

– Você pode não cantar em português, não dançar samba direito ou mesmo não saber tocar nenhum instrumento. O importante é que faça minha irmã feliz.

Em seguida, a noiva voltou para os braços do noivo. Havíamos também escolhido a valsa que seria tocada, mas, para nossa surpresa, uma amiga de Anapaula subiu ao palco com um acordeom e pediu permissão para tocar a valsa. Uma valsa típica finlandesa e bem antiga. Todos se emocionaram.

Chegou, finalmente, a hora de cortar o bolo. Os noivos optaram por um bolo com cobertura de chocolate, decorado com rodelas de abacaxi e rosas amarelas e laranjas. Não quiseram o branco tradicional. Em cima do bolo, como decoração, havia os noivos: o homem estava vestido de jogador de futebol com uma bola embaixo do pé porque estávamos em clima de Copa do Mundo, e a mulher, vestida de noiva. Estavam embaixo de um coqueiro, simbolizando as praias do Brasil.

Havia, ainda, uma mesa repleta de uvas, com uma variedade de queijos e biscoitos típicos feitos pela mãe do noivo, tortas de frutas, pães doces, café, chás e vários tipos de geleias, incluindo a de tyrni, uma fruta silvestre muito rara na Finlândia. Essa é encontrada em algumas ilhas em alto-mar, em um arquipélago entre a Finlândia e a Suécia. Sua planta é rasteira e contém muitos espinhos, por isso, para que se colha a fruta, são necessárias luvas especiais, também desenvolvidas com tecnologia finlandesa. Vale lembrar que essa fruta tem uma quantidade enorme de vitaminas: ômega 3, 6, 7 e 9, além de outras substâncias benéficas para a saúde.


 pães, salgados diversos, queijos, uvas, frutas, etc...


geléia de Tyrni

Fruta silvestre chamada Tyrni

A festa continuava com a orquestra tocando sempre música brasileira. Eu me sentia realizada por ver que os convidados estavam se divertindo bastante e sendo bem servidos de comida e bebida. Valeu a pena tanto trabalho.

Eu teria que entregar o salão à meia-noite. Lá pelas 23 horas, a festa estava muito animada, e as pessoas não arredavam os pés do salão. O noivo, então, virou-se para mim com a maior naturalidade e disse:

– Nós estamos saindo para nossa lua de mel, e gostaria que você acompanhasse todos os convidados ao Café Barroco, no centro, onde eles irão continuar a festa. Já telefonei para lá e fiz a reserva.

Olhei para ele sem acreditar no que estava ouvindo. Eu estava exausta! Depois de mais de um mês de trabalho intenso, sem ter dormido bem as últimas noites, onde encontraria forças para continuar? Mas parecia que não tinha outra opção. Não havia tempo para pensar porque já estava chegando meia-noite, e o salão teria que estar vazio, o que era outro problema. Onde iria colocar tantas rosas e tanta comida que havia sobrado? Os pratos, talheres, copos e taças eram do salão, mas havia bandejas, vasos de flores, toalhas de mesa e tantas outras coisas que teria que levar para casa. Minha amiga Paula foi muito rápida e começou a pôr, em uma velocidade incrível, tudo dentro do carro. Em poucos minutos, com a ajuda de alguns convidados, o salão estava desocupado. Passei primeiro em casa para deixar as coisas e trocar de sapatos.

No Café Barroco, um restaurante da moda em Helsinki, havia música ao vivo. Encontrei nossos convidados à minha espera já tomando seus drinques. A festa rolou até o amanhecer.

Quando cheguei a minha casa, não tive nem coragem de colocar a comida para congelar. Fui direto para a cama. Acordei quatro horas depois e tive que me apressar, pois havia combinado com Anapaula de nos encontrarmos no hotel para que Ricardo, que também nos encontraria lá, pudesse tocar a música que havia feito para os noivos e não tinha tido oportunidade de tocar na hora da cerimônia. Depois disso, os noivos viajariam em lua de mel.

No comments:

Post a Comment