Fiquei algumas horas no hospital mesmo depois de fazer todos os exames. Àquela altura, já estavam comigo Anapaula, Jouko e Adriana. Voltei para casa sentindo-me bem e, a partir daí, comecei a controlar minha pressão arterial com remédios, e Jouko providenciou um aparelho para medi-la sempre. Continuei a fazer o tratamento de coluna com o osteopata, mas sentia uma melhora muito pequena.
Jouko fazia um projeto na Alemanha, e eu não estava com ele devido ao meu tratamento de coluna, porém ele veio passar conosco o Natal e o Ano Novo, retornando depois para a Alemanha.
No início de janeiro, sentia que aquele tratamento, além de muito caro, não estava ajudando muito. Ouvi falar de um médico ortopedista inglês que trabalhava em Londres e estava aplicando injeções de cortisona na coluna para eliminar inflamações. Não perdi tempo, liguei para ele e marquei uma consulta para a semana seguinte, aproveitando minha ida ao Brasil, e pagando um pouco mais pela passagem para ficar três dias em Londres. Esse médico conversou comigo, dizendo que eu teria que fazer pelo menos três aplicações, mas, para isso, precisaria permanecer por mais de três dias em Londres depois que fizesse cada aplicação, pois precisaria de repouso. Então acertamos que, depois de três meses, iniciaria meu tratamento ao retornar dessa viagem ao Brasil.
Minha estadia no Brasil era sempre boa uma vez que ficava com meus familiares e aproveitava o sol, coisa rara na Finlândia, procurando sempre estar na praia. Por outro lado, o momento de meu retorno, em meio à despedida de meus parentes, era sempre doloroso para todos nós.
Depois de uma viagem longa e cansativa, desci em Londres para a primeira aplicação da injeção de cortisona. O médico preparou-me:
– Senhora Maria José, não tenha medo. Vai ser um pouco dolorido, mas muito rápido. Procure relaxar o quanto puder, pois ajuda muito.
Procurei ficar tranquila o máximo que pude, apesar, é claro, de estar com medo. Mas tudo correu bem. Fiquei algumas horas de repouso na clínica e depois tomei um táxi para o hotel. Quando retornei à Finlândia, já estava sentindo certo alívio.
Depois de uma semana, fui à Alemanha para ver meu marido. Já não aguentava mais de saudades dele, não o encontrava há quase quatro meses. Ele estava à minha espera no aeroporto de Berlim. Seguimos de carro para Beeskow, uma cidade a sessenta e cinco quilômetros de Berlim, onde ele estava trabalhando. Morava em uma casa grande e confortável, e havia uma senhora que ia lá todos os dias para cozinhar e fazer a limpeza.
Beeskow, Alemanha |
Fotos by blackbirdxx |
Foto by mitue via Flickr |
A cidade era pequena, e tive um pouco de dificuldades para comunicar-me. Pelo fato de essa região ter pertencido à Alemanha Oriental, quase ninguém falava inglês, o que me fazia depender de Jouko, que falava alemão, para ser meu tradutor quando necessário. Perto de onde morávamos, havia um restaurante ao lado do rio no qual se servia uma truta com amêndoas que era uma delícia. Também, em outro lugar, tinha um castelo do século XIX que fora transformado em um restaurante onde foram conservados a arquitetura, os móveis e também alguns pratos da época no menu, como, por exemplo, faizão com frutas e arroz selvagem. Os garçons vestiam trajes desse século.
Minha coluna continuava a incomodar, por isso, procuramos um médico em outra cidade chamada Eisenhuttenstadt. No consultório, conversamos com o médico, e, enquanto me examinava, sem aviso prévio, aplicou uma injeção em meu pescoço. Assustei-me porque não esperava, mas, como num passe de mágica, a dor de cabeça que sentia desapareceu. O médico falou que, se ele tivesse me avisado da injeção, eu não deixaria. Deveria fazer fisioterapia duas vezes por semana, e, para isso, era necessário que Jouko deixasse o trabalho por duas horas para acompanhar-me. Passaram-se dois meses e embora estivesse fazendo tudo que o médico havia recomendado, inclusive as caminhadas e os exercícios, não sentia nenhuma melhora na coluna. Parecia que nada acabaria com as minhas dores.
Resolvi, então, voltar à Finlândia e, de lá, providenciar a passagem para Londres, onde faria o resto das aplicações de cortisona. Antes disso, teria que esperar por uma semana porque Anapaula estava se formando. Decidimos que não faríamos a festa em casa, como a de Ricardo. Anapaula conseguiu o restaurante do colégio, onde fizemos uma bela decoração toda amarela e laranja. Convidamos muitas pessoas, em torno de cem, entre amigos nossos e de Anapaula. O trabalho também foi muito porque teríamos que deixar o restaurante pronto antes das nove da manhã. Foi possível usar tudo do local, como pratos, talheres, copos de água, taças de vinho branco e tinto, pratos para sobremesa e outros, diminuindo, assim, nosso trabalho. Só precisei levar toalhas de mesa, guardanapos, flores, comidas, doces e bebidas, e dentre essas, um vinho tinto brasileiro, da região do rio São Francisco, chamado Amazon.
Às nove horas em ponto, estávamos todos sentados, e, em seguida, começou a cerimônia, que demorou em torno de duas horas. Às onze horas, descemos para o restaurante a fim de receber os convidados. À proporção que as pessoas iam chegando, a quantidade de rosas aumentava. Enquanto Anapaula recebia os convidados, eu me encarregava de arrumar um lugar para as flores. As pessoas iam chegando aos poucos já que neste o dia todos os estudantes estavam se formando, e muitas eram convidadas para participarem também de outras festas. No final da tarde, o restaurante estava completamente lotado. Dessa vez, para facilitar, servi só comida fria como saladas, salmão defumado e peru fatiado. Ricardo e sua namorada, que era soprano, animaram a festa até meia-noite. A mãe do noivo de Anapaula levou dois bolos de formatura muito bonitos e deliciosos e também me ajudou a servir os convidados.
Logo após a formatura, providenciei, junto à agência de turismo, uma viagem para Londres para continuar o tratamento da coluna. O hotel ficava a vinte minutos de carro da clínica, localizado em uma rua ao lado da famosa Ponte de Londres, um dos pontos turísticos da cidade. Como eu havia feito a primeira aplicação no final de abril do mesmo ano, já sabia que sentiria dor, mas, apesar disso, tudo correu bem. Teria que esperar mais uma semana para tomar a seguinte. Aproveitei o tempo livre para visitar os pontos turísticos que lá existem, como o Museu de Cera, o Museu de História Natural e outros. No final de semana, estava tomando o café da manhã quando ouvi alguém falar português. Era um casal de São Paulo com dois filhos, que estavam hospedados no mesmo hotel, mas não havíamos nos visto antes. A partir dali, tive companhia por mais três dias. Íamos jantar juntos, visitar pontos turísticos, como a troca de guarda no Palácio. Na partida deles, trocamos nossos endereços.
Ponte de Londres by Les Voyage de Cath via Flickr |
A Troca da Guarda no Palácio de Buckingham (Foto by Márcio Cabral de Moura via Flickr) |
Museu de Históra Natural de Londres - Foto by Márcio Cabral de Moura via Flickr |
Interior do Museu de História Natural - Foto by Andre Santiago via Flickr |
Antes da terceira aplicação, fiz, com uma fisioterapeuta vinda da Nova Zelândia, como parte do tratamento, algumas sessões de fisioterapia. Quando fiz a terceira aplicação, já me sentia melhor, com mais confiança e otimismo quanto ao tratamento. Antes de minha partida, fui ao teatro assistir a peça Miss Saigon. Adorei!
Retornei à Finlândia, Jouko estava à minha espera no aeroporto, pois já havia voltado da Alemanha, e fomos direto para nossa casa de verão em Saarijärvi. Ele tirou férias de um mês, e, com sua ajuda, comecei a me recuperar. Existe lá uma área verde, uma espécie de parque com lugares adequados para caminhadas. É muito lindo. Tem uma vista belíssima: na parte de cima, a floresta e, embaixo, um lago com águas límpidas de um azul de tirar o fôlego. Íamos todos os dias fazer caminhadas. No início, Jouko me acompanhava com o carro, caso eu sentisse alguma dor. Depois, já recuperada e andando normalmente, ele caminhava comigo. Adriana estava de férias e foi passar uns dias conosco. Ela também me acompanhava nas caminhadas. Jouko retornou ao trabalho e fiquei lá ainda por algumas semanas. Nos finais de semana, ele dirigia mais de quatrocentos quilômetros para ficar comigo.
Caminhada com a sauva - em Sààrijärvi, onde fica a nossa casa de verão. Esse local fica próximo à casa onde Jouko nasceu. |
Com as chuvas, chegavam os cogumelos silvestres, que são uma iguaria da Finlândia. Comecei a apreciar a colheita, indo todos os dias para a floresta e sempre voltando com a cesta lotada. Lógico que, para isso, a esposa de meu cunhado, que é nutricionista, deu-me aulas de como identificar os comestíveis e como prepará-los também. Foi uma verdadeira terapia. Entre os comestíveis, existem dois que são muito gostosos e são as estrelas apreciadas por todos os finlandeses. O primeiro chama-se kantarelli (Cantharellus Cibarius), de cor amarelo-ouro, com formato de uma flor. O outro, de tamanho bem mais avantajado, tem o caule branco e a parte de cima de cor marrom, conhecido como herkkutatti (Boletus Edulis). Há outros também da mesma família, como por exemplo, o Boletus Pinophilus, que tem a cor marrom mais escura. Não seria possível mencioná-los todos aqui, pois a variedade é muito grande, e são encontrados nas florestas de norte a sul da Finlândia entre maio e agosto. Existe outro tipo chamado suppilovahvero (Cantharellus Tubaeformis), que cresce na floresta de setembro a outubro e também é uma delícia. O curioso é que a quantidade desses cogumelos é tão grande que os finlandeses, como forma de terapia, vão para as florestas colhê-los para uso próprio. E ainda é necessário que algumas empresas alimentícias contratem pessoas vindas da Tailândia, Vietnã e Filipinas para esta colheita. Esses trabalhadores eventuais vêm para a Finlândia com todas as despesas pagas.
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