Nosso voo para Frankfurt foi ótimo, e, em nossa chegada à Finlândia, os termômetros marcavam -10ºC. Era dia 14 de janeiro. Depois de três dias, seguimos viagem para o Brasil. Eu fiz o voo Helsinki – Londres, e Jouko, Helsinki – Munique – Londres. Voávamos em companhias aéreas diferentes para usarmos nossas milhas. Eu voava com a Finnair, e ele, com a Lufthansa. Às 21 horas, Jouko e eu nos encontramos no aeroporto de Londres, precisamente no balcão da Varig. Nosso voo para São Paulo sairia às 22 horas e 20 minutos. Fomos acomodados nos assentos da classe executiva do Boeing 777. Era um luxo só! Tínhamos televisões exclusivas, com direito à internet e a usar cartões de crédito para ligações telefônicas. Tivemos um jantar maravilhoso com uma comida preparada por um chefe norueguês. Mal acabamos de jantar, olhei para meu marido e percebi que ele já dormia. Estava tão cansado com a maratona dos últimos dias que sequer reclinou sua poltrona, que parecia uma cama.
Às 7 horas da manhã do dia seguinte, descemos no Aeroporto de Cumbica, em Guarulhos, São Paulo. Pegaríamos o voo das 9 horas e 15 minutos para Salvador. Infelizmente, com tanta burocracia e morosidade no controle de passaporte e na alfândega, perdemos nosso voo. Conseguimos embarcar quase ao meio-dia.
Estavam à nossa espera no aeroporto de Salvador, como sempre, minha família e meus amigos. Não tenho palavras para descrever a beleza desse momento de poder abraçar as pessoas que amo e, mesmo fazendo isso todos os anos, o que sinto é indescritível.
Orla de Salvador (Foto GOVB via flickr) |
Orla (Foto Marco H Monteiro via flickr) |
Dois dias após nossa chegada, já descansados, acordamos mais cedo e fomos andar na orla até o Aeroclube, um shopping à beira-mar. Quando lá estávamos, tivemos a ideia de alugar um carro para irmos ao Conde, mas, em vez de alugarmos na Localiza, Avis ou Hertz, onde sempre alugávamos em qualquer parte do mundo, convenci meu marido a procurarmos uma locadora de carro de um conhecido nosso. Lá, ofereceram-nos uma Parati, alegando que era o melhor carro que tinham disponível. Acertamos tudo e pagamos com nosso cartão de crédito, e, enquanto fui à lanchonete ao lado, Jouko assinou um boleto em branco como garantia do aluguel. Assim que saímos da locadora, percebemos que o carro estava caindo aos pedaços, e Jouko notou também que havia muitos problemas mecânicos, além de já ter mais de cem mil quilômetros rodados. Aquilo me deixou muito chateada porque, na verdade, tínhamos muitas opções de locadoras para alugar um carro bom, mas eu insisti para irmos a essa, pois, como sempre, estava querendo ajudar uma pessoa conhecida. Não perdemos tempo, imediatamente retornamos à locadora e pedimos um carro melhor. Dessa vez, o dono, que era amigo de minhas filhas, muito solícito e amável, veio nos atender e levou-nos para a garagem onde havia um Fiat Marea e um Ford Focus estalando de novos. Fizemos a troca e aceitamos o preço absurdo pedido por ele que, segundo disse, incluía o seguro total. Depois disso, à tarde, seguimos para o Conde, hospedamo-nos no Hotel Praia do Conde, considerado o melhor hotel daquela região.
No início da semana seguinte, retornamos a Salvador pela manhã. Iríamos passar em Porto Sauípe para almoçar com minha irmã, Regina, e seu marido, Mário. De lá, resolvemos visitar o complexo hoteleiro Costa do Sauípe, localizado no litoral norte da Bahia. No portão de entrada, uma moça muito mal educada veio logo nos dizendo que a entrada para visitas custava sessenta reais por pessoa. Como estávamos em cinco pessoas, achamos que ia sair muito caro apenas para uma visita. Além do mais, lugares como esses não são nenhuma novidade para nós, uma vez que estamos acostumados a ir a esses locais não só para visitar, mas também para morar por muitos meses, como nos diversos países em que Jouko teve que trabalhar.
Seguimos viagem para Salvador. Eu sentia que Jouko estava um pouco cansado, mesmo assim, chamei-o para irmos a um grande supermercado localizado perto do Iguatemi. Como Jouko estava dirigindo e não conhecia o caminho, fui orientando-o durante o percurso. E eu me esqueci de falar-lhe que, depois de sairmos do supermercado, ele teria que retornar à esquerda para seguirmos em direção a nossa casa. Orientei-o, então, a seguir por outro caminho. Já estava escurecendo e, em uma transversal, com uma sinalização precária, Jouko parou para olhar e dobrar à esquerda, mas não conseguiu enxergar direito porque havia, além de uma árvore, capins muito altos que tiravam sua visibilidade. Com um pequeno avanço que meu marido deu, um ônibus, em alta velocidade e com os faróis baixos, bateu em nosso carro e nos arrastou por alguns metros, danificando bastante a frente do carro. Olhamos um para o outro em choque, sem entender como aquilo havia acontecido. As consequências só não foram piores porque o motorista desviou o ônibus para amortecer o impacto, caso contrário, não estaria hoje contando essa história. A frente do carro ficou praticamente embaixo do ônibus. Era um ônibus de uma empresa que estava levando seus funcionários para casa. Os passageiros entraram em pânico, pois a porta da frente não se abria. Enquanto isso, nós também estávamos em choque e sem palavras. Com os gritos dos passageiros, meu marido saiu daquele estado de choque e, como o motor estava funcionando, conseguiu afastar um pouco o carro para abrir a porta do ônibus e liberá-los. Nunca havia acontecido nenhum acidente com meu marido, que dirigia havia mais de quarenta anos, em vários países do mundo, acostumado a dirigir até em mão inglesa. Estávamos completamente desnorteados. Depois de duas horas do acidente e com muita morosidade, chegaram o Detran e a locadora para fazer o boletim de ocorrência. Fiquei com muita pena de Jouko, pois, além de estar muito chocado, estava também apreensivo e cansado. E eu me sentia bastante culpada por aquele ocorrido. Logo em seguida, meu filho, Ricardo, chegou, e percebi que Jouko ficou um pouco mais relaxado. Naquele momento, pude confirmar o verdadeiro relacionamento de pai e filho construído entre eles. Estávamos mortos de fome e cansados. Lembrei-me de que, perto do local do acidente, morava minha amiga Graça Coni. Depois que entrei em contato com ela, além de oferecer-me um jantar, ficou comigo no local até resolvermos tudo. Quatro horas depois do acidente, conseguimos sair daquele maldito lugar, finalmente, já com outro carro levado pela locadora e com o boletim de ocorrência pronto.
No dia seguinte, Jouko e Ricardo foram à locadora a fim de entregar o carro e combinar que, quando chegasse o resultado do boletim de ocorrência do Detran, a locadora faria contato conosco para que soubéssemos se teríamos que pagar algum valor ou não. No contrato de locação, era dito que, em caso de acidente ou perda total do automóvel, teríamos que pagar dois mil e quinhentos reais e o seguro cobriria o restante. Se houvesse perda parcial, nada pagaríamos. Na entrega do carro, Jouko, ainda em choque, esqueceu-se de pegar o boleto do cartão de volta.
No outro dia, eu, Jouko e meu filho pegamos um voo para São Paulo e, de lá, seguimos em outro voo para Navegantes em Santa Catarina. Fomos passar três dias no Balneário de Camboriú e conhecer a família da namorada de meu filho em Itajaí, uma cidade vizinha àquela em que estávamos. Em Camboriú, ficamos hospedados em um hotel em frente ao mar com uma vista de tirar o fôlego. À noite, saímos todos para jantar em um restaurante muito chique, a convite da mãe da namorada de meu filho, que era proprietária da segunda maior fábrica do Brasil de cordas de nylon para uso em navios e outras utilidades. A primeira era de seu irmão. Ela, sozinha, tinha o controle da fábrica porque o marido falecera havia alguns anos.
Camboriú - Santa Catarina (Foto by Dirceu S Oliveira via flickr) |
Camboriú, orla (Foto by Richard Kramer via flickr) |
Balneário Camboriu visto de dentro do bondinho que leva ao cerro da Aguada a 240 mt de altura. (Foto by jurviegas via flickr) |
Itajaí - SC - Porto (Foto by Everaldo José dos Santos via flickr) |
Porto de Itajaí (Foto by Everaldo José dos Santos via flickr) |
Vista de Itajaí - SC (Foto wikimedia.org) |
Centro de Itajaí, com igreja matriz (Foto wikimedia.org) |
No dia de nosso retorno, tomamos um voo para São Paulo. De lá, Jouko voltaria à Europa, e eu, a Salvador para ficar mais tempo com minha família no Brasil.
Passaram-se duas semanas, e nada de a locadora telefonar para dizer o resultado do laudo do Detran. Mas recebi, na terceira semana depois do acidente, um telefonema de uma seguradora de Salvador dizendo ser a seguradora do carro acidentado. Para minha surpresa, fui informada de que esse carro pertencia ao irmão do dono da locadora, que era gerente de banco. A seguradora informou-me que não tinha havido perda total e, portanto, eu não teria que pagar nada pelo ocorrido. Nós apenas teríamos que mostrar o Contrato de Locação, contrato esse ilegal, uma vez que o carro envolvido não pertencia à locadora. A própria seguradora já tinha me dito que não precisaríamos pagar nada.
Depois de alguns dias, eu estava passando o final de semana em Porto Sauípe, onde minha irmã Regina tinha uma pousada. Éramos uma turma grande: eu, Adriana e seu filho, que estavam no Brasil, Madalena, Graça, Litinha, Jaqueline, Jocely e Janine. No sábado, depois do jantar, estávamos todas reunidas conversando quando o telefone tocou, e era Jouko ligando da África do Sul. Havia retornado àquele país para realizar a segunda fase de seu projeto. Fiquei sem fala quando ele me contou uma história de terror, ou melhor, um ato criminoso feito pela locadora onde havíamos alugado o carro anteriormente. Ficamos sabendo que, assim que o dono da locadora saiu do local do acidente, sem nenhuma ética e nenhum escrúpulo, sem nenhum respeito pelo cliente, solicitou, através do cartão de crédito de meu marido, um pagamento de mais de cinco mil dólares uma vez que a locadora havia ficado com um boleto do cartão de crédito em branco assinado por Jouko. O proprietário da locadora passou por cima de todos os princípios da moral e do respeito pelos direitos humanos. Nem havia esperado o resultado do boletim de ocorrência do Detran. Algum tempo depois, entramos com uma ação na justiça contra esta locadora. Porém, passado um tempo, Jouko não quis mais brigar na justiça e pediu o cancelamento da causa. Tomou essa atitude por ser um homem muito ocupado e porque, no final, gastaria muito tempo e dinheiro com viagens para o Brasil e perderia muito tempo.
Eu continuava ao lado de minha irmã gêmea, que lutava contra a diabetes adquirida havia um ano. Ela já tinha emagrecido bastante. Certa manhã, ao acordar, senti alguma coisa estranha na vista como se não conseguisse enxergar direito. Visitei meu médico, que pediu exames de laboratório, os quais eu fiz em seguida. Duas horas depois de ter feito os exames, minha sobrinha, Jocely, que trabalhava no laboratório, ligou-me para dizer o resultado de minha glicemia. Não acreditava no que ouvia. A taxa de meu açúcar estava muito alta, em quase quatrocentos, quando o normal é uma taxa de cem até cento e dez. Pensei que talvez o exame pudesse ter sido trocado, eu não acreditava que aquilo estava acontecendo comigo. Logo eu, que estava fazendo caminhadas praticamente todos os dias, fazia quase dois anos, e já havia parado de comer açúcar, pois tinha o maior cuidado com minha dieta?! Retornei ao laboratório, fiz um novo exame e, infelizmente, veio a confirmação de que estava mesmo com diabetes. Ouvi de meus médicos do Brasil e da Finlândia que esse problema era genético e nada podia ser feito a não ser tomar o remédio apropriado.
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