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Wednesday, June 5, 2013

TRILHANDO NOVOS CAMINHOS (Parte2)


Ainda nessa época, recebi de Porto Alegre uma carta de uma pessoa da AAA (Associação dos Alcoólicos Anônimos), dizendo-me que meu ex-marido já estava quase recuperado e pedindo-me que lhe desse mais uma chance. Não adiantou porque não sentia mais nada por ele. Eu lhe desejava o melhor, mas longe de mim. Eu já o via apenas como uma pessoa qualquer, não mais como companheiro. Respondi a carta, dizendo que tudo havia realmente terminado.

Sem emprego e cheia de dívidas, dei-me conta de que estava no fundo do poço e não sabia como sair. Além disso, meu ex-marido havia retornado do Rio Grande do Sul, segundo ele, já recuperado da bebida e querendo voltar para mim. Ele pedia a todos que me conheciam que me aconselhassem a voltar para ele.

No último dia desse mesmo ano, ainda triste e desanimada, recebi um convite de uma amiga de minha irmã:

– Iaiá, vá trocar essa roupa porque hoje é véspera de Ano Novo, e nós vamos fazer uma homenagem para Iemanjá. Vamos jogar flores para ela nas águas da praia do Rio Vermelho.

– Desculpe-me, dona Nilia. Não tenho vontade de ir a lugar algum. Como posso pensar em sair se estou sem dinheiro, trabalho, com dívidas e ainda com problemas de saúde? – respondi-lhe.

Mas ela insistiu:

– Você vai sair dessa situação com a força, a fé que tem em Deus, a bondade e a esperança que sei que ainda não perdeu. Se você ficar em casa, também não vai resolver nada.

Mais tarde, então, estávamos na água do mar fazendo nossos pedidos. Eu estava vestida com uma roupa vermelha, cabelos bem penteados e até um pouco alegre e descontraída. Ali mesmo, rezei e pedi a Deus e a todos os irmãos de luz que dessem um alívio para minha vida.


Festa do Rio Vermelho, Salvador, Bahia (Foto: Flickr by Vanessa Aragão)

Foto: Flickr by Juliana Nakatani
Rio Vermelho, Salvador, Bahia (Foto: Flickr by memanoel)

Foi decidido que seguiríamos da praia para um restaurante com música ao vivo na Pituba. Eu falava que de jeito nenhum iria junto porque queria voltar para casa.

– Não senhora! – dizia minha irmã. – Você irá conosco nem que tenhamos que amarrar você dentro do carro.

Terminei concordando, e fomos ao tal restaurante. Éramos um grupo de seis mulheres.
Foto Flickr by Mauricio Almeida

– Regina, dê-me seu isqueiro. – pedi.

– Acho que perdi o meu. Peça àquele loiro bonitão que não pára de olhar para você desde que chegamos. – respondeu-me Regina.

– Por acaso eu tenho cara de pedir alguma coisa para alguém que eu não conheço?

– Por que não? – dizia Regina. – Ele parece que é estrangeiro e, além do mais, é boa pinta. Você não acha?

– Eu não acho nada! Para mim, todos os homens são iguais e não valem nada.

Assim que acabei de concluir essa frase, eu o vi em minha frente convidando-me para dançar. É lógico que não fui, pois havia perdido o interesse em tudo, principalmente nos homens. Acho até que só estava continuando a viver por causa de meus filhos e das pessoas de minha família que me amavam muito.
Foto: Flickr by bueno_asemana)

Passado algum tempo, ele voltou e convidou-me novamente. Mais uma vez não aceitei. Imaginem que, àquela altura, a torcida era grande. Insistiram tanto que finalmente decidi aceitar. Depois ele veio sentar-se em nossa mesa e tentávamos nos comunicar, pois o português que ele falava era quase incompreensível. Conseguimos saber que se chamava Jouko, era da Finlândia e estava na Bahia dirigindo um projeto grande na Caraíba Metais em Camaçari. Dançamos mais um pouco, trocamos telefones, ele gentilmente pagou nossa conta e nos despedimos quase às seis da manhã.

Fora do restaurante, com o dia já claro, olhava para ele o achando mais bonito. Usava uma camisa branca, gravata cinza clara e calça cinza um pouco mais escura. De lá, mostrou-nos o prédio onde morava, Edifício Cedro, na Rua Amazonas, Pituba, e nos despedimos. Já passando das seis da manhã, chegamos a casa. Logo em seguida, o telefone tocou, e era ele nos convidando para a Festa da Boa Viagem. Só tivemos tempo de tomar café, um banho e trocar de roupa. Na hora marcada, ele estava na porta do prédio para nos apanhar. Eu fui no carro dele, e Litinha, no dela com as meninas.

Procissão do Bom Jesus dos Navegantes, na festa da Boa Viagem em Salvador, Bahia (Foto via Google)

Imagem de Bom Jesus dos Navegantes sendo transportada pelos fuzileiros navais. A diversão da festa é garantida a partir da meia-noite por músicas e danças nas barracas que servem comidas e bebidas típicas, indo até a chegada da Procissão do Bom Jesus dos Navegantes na praia do mesmo nome. (Foto: Flickr by Mario Sérgio Fotografia

Passamos quase todo o dia por lá bebendo e comendo. Eu já estava sentindo certo interesse por ele devido à atenção que dava a mim e a minha família.

Imaginava, ao mesmo tempo, que não queria nada sério comigo. Ele era bonito, solteiro, culto, rico, engenheiro, diretor de multinacional e falava mais de seis línguas! O que poderia querer com uma mulher desquitada, com três filhos e que, ainda por cima, só falava português? Imaginei que não daria certo. Mesmo assim, decidi ir em frente. Pelo menos, teria alguns momentos de felicidade. No final da tarde, deixou-nos em casa com a promessa de, no dia seguinte, levar-me para jantar. Para minha surpresa, no dia seguinte mesmo, telefonou para mim e marcou a hora em que iria me apanhar. Já conseguia entendê-lo melhor. Acho que, no início, como não estava interessada, não conseguia entender o que ele falava. Todas as noites, pontualmente às sete horas, lá estava ele na porta do prédio à minha espera. Sempre me levava para os lugares mais chiques de Salvador, aqueles que antes eu só visitava em sonhos. Certa vez, convidou-me para irmos ao Hotel Quatro Rodas para uma noite de queijos e vinhos. Então, disse-lhe:

– Desculpe-me, mas não posso ir porque não tenho roupas e nem sapatos próprios para essa festa.

Eu já estava saindo com ele fazia quase um mês, tomando emprestados roupas e sapatos, e não tinha mais o que vestir.

– Não tem nenhum problema. Amanhã, iremos ao Shopping Itaigara e você pode comprar o que quiser.

Fiquei um pouco sem jeito, mas acabei aceitando e, naquela noite, usava um vestido longo preto, com alcinhas de strass, sapatos pretos também com strass e bolsa combinando. Estava naquele ambiente maravilhoso, com aquele homem elegantemente vestido, cheio de atenções comigo, esforçando-se ao máximo para que pudéssemos nos fazer entender, ouvindo uma cantora de fado de Portugal chamada Paula Saldanha. Parecia que estava vivendo um sonho, e tinha medo de acordar.

Foto: Flickr by Felipe Vieira

Foto: Flickr by Felipe Vieira

Foto: Flickr by Felipe Vieira

No final da festa, finalmente levou-me para sua casa e, nesses trinta dias de convivência, era a primeira vez que ficávamos intimamente juntos. Na manhã seguinte, Jouko fez-me uma proposta irrecusável:

– Maria, o que você acha da idéia de as crianças virem morar conosco? Se você aceitar, iremos buscá-las agora mesmo, e farei todo o possível para ser um bom pai. O apartamento é grande, e eles podem ter seus próprios quartos.

Fiquei sem fôlego. Claro que concordei! Finalmente iria dar uma vida decente a meus filhos e colocá-los em uma boa escola. Na mesma tarde, fizemos a mudança após uma conversa com as crianças. Elas ficaram muito contentes porque já tinham um bom relacionamento com Jouko e também suas vidas estavam mudando para melhor. Por outro lado, meu ex-marido não desistia de procurar-me, mesmo quando eu e meus filhos já morávamos com Jouko. No entanto, eu não podia de jeito nenhum voltar para ele outra vez. Primeiro, porque só sentia pena dele e, principalmente, porque já havia encontrado o homem de minha vida. Embora soubesse que a bebida tinha sido a principal causa da destruição de nosso casamento, nada mais restava, e ele teria de aceitar.

Comecei uma nova vida morando em um apartamento de luxo com meus filhos e um homem que comecei a amar com todas as forças de meu coração.

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